"Não, de verdade?", disse Alice em um tom surpreso.
"É claro que não", disse a Falsa Tartaruga. "Por exemplo, se um peixe vem a mim e diz que vai fazer um passeio, e digo logo 'Com que delfim?'"
"Você não está querendo dizer "com que fim?'"
"Eu quero dizer o que disse", a Falsa Tartaruga replicou em um tom ofendido. E o Grifo completou, "Venha, agora queremos ouvir algumas das suas aventuras."
"Eu posso contar-lhes minhas aventuras...começando por esta manhã", disse Alice um pouco timidamente. "Mas não adianta contar desde ontem, porque eu era uma pessoa diferente ontem."
Nossa, fazem três anos já. Três anos desde quando eu decidi revisitar as antigas Ação Games da minha infancia e jogar todos os jogos dela, escrevendo sobre a maior parte deles. Algo que eu sempre quis fazer quando criança e era um sonho absolutamente impossível, diga-se de passagem.
E tal qual Alice, três anos atrás eu era uma pessoa totalmente diferente do que sou hoje em todos os aspecto que você possa imaginar. Emocional, fisico e financeiro. Impressionante como as coisas melhoraram tanto nestes anos desde que eu comecei a fazer isso. Não que exista uma correlação aqui, apenas é um marco interessante dessa passagem de tempo.
Me ocorreu bastante esse tema porque "The Revenge of Shinobi" foi o primeiro jogo que eu joguei para esse fim, e o resultado foi uma review medonha hahaha. Na verdade nem é uma review, eu fiz um Let's Play da primeira fase no youtube e ficou muito, muito ruim. Eu também escrevo melhor do que três anos atrás, veja você. E o que seria mais apropriado neste aniversário de três anos do blog do que falar sobre a continuação de Revenge of Shinobi, mais conhecido como Shinobi III: O Retorno do Mestre Ninja?
A capa japonesa é mais bonita, como de costume, apesar do nosso herói estar fazendo uma pose de quem está se escondendo da mãe atrás do arbusto |
MAS COMO QUE É UMA CONTINUAÇÃO SE É O TRÊS?
Excelente pergunta, voz na minha cabeça que também não existia três anos atrás! Isso porque a Sega do Japão criou duas franquias sobre ninjas completamente separadas: Shinobi e Shadow Dancer. De fato, são duas séries bastante parecidas onde um ninja de branco avança para a direita e atira shurikens em punks e outros malfeitores. A grande diferença sendo que em Shadow Dancer nosso aprendiz de Narutinho é acompanhado por um doguinho de combate, enquanto Shinobi é sobre um homem triste sem razão de existir dado que ele não tem um doguinho.
Percebendo a similaridade entre as duas séries, a Sega da América decidiu juntar as duas numa só e dessa forma o jogo do Shadow Dancer foi portado para Mega Drive e Master System como Shadow Dancer: The Secret of Shinobi criando uma relação que nunca existiu no original japonês.
Assim sendo, para os japoneses este jogo que eu estou falando agora é apenas Super Shinobi 2 - continuação de Revenge of the Shinobi - enquanto para os americanos é Shinobi 3 porque eles estão contando Shadow Dancer no meio.
Surf ninja, just because! |
PARECE ESTRANHO DIZER ISSO, MAS EU MEIO QUE ENTENDO O PONTO DA SEGA DA AMÉRICA. TER UMA FRANQUIA É MELHOR DO QUE TER DUAS BASICAMENTE IGUAIS.
A Atlus mandou um beijo, com seus Shin Megami Tensei, Persona, Digital Devil Saga e Devil Survivor. Mas sim, suponho que você tenha razão, é uma decisão comercialmente mais inteligente focar em uma marca só do que segmentar seu publico alvo.
Que bom que a Sega entende tudo sobre isso...
Yeah, about that... |
Enfim, isso explicado, falaremos do joguete em si, sim?
Nossa história começa abrindo com um extrato do "Manual Secreto do Ninjitsu Oboro", guarde bem essas palavras pois elas não terão relevancia NENHUMA na história ou serão evocadas novamente. Mas, embora não queiram dizer nada, soam como coisas ninjas muito legais e isso é o que realmente conta nos anos 90.
No jogo original de Shinobi para Arcade (nunca portado para o Mega Drive, por isso não entra na numeração da série contagem da Sega), havia uma organização de punks do mal que odeiam o bem chamada Zeed. Um dia, a Zeed decidiu que seria muito bacanudo ter ninjas para fazer suas coisas malignas de maldade perversa porque eles gostam de coisas malignas de malignidade perversa e ninjas são legais.
Tem que ver essa conjuntivite aí, amigo |
O problema é que treinar ninjas dá trabalho, e eles são punks! Punks não trabalham, apenas passam o dia sentados na rua escondendo frangos assados dentro de latas de metal gigantes - todo mundo sabe disso!
Felizmente havia uma solução rápida para contornar isso: sequestrar crianças ninjas de uma academia ninja. Pronto, você teria seus ninjas sem precisar treina-los!
Vá para OUTRA DIMENSÃO *risada de Saga de Gemeos* |
...
O que obviamente terminou tão bem quanto soa, quando um único ninja daquele clã - chamado Joe Musashi - exterminou a gangue e matou seus líderes. Sério caras, o que vocês esperavam que acontecesse, exatamente?
Três anos depois do massacre da Zeed pelas mãos e shurikens de Zé Musashi, os sobreviventes da Zeed decidiram que não tinham aprendido a lição e resolveram se vingar do Zé apenas por puro espirito de porco mesmo. Para isso, agora sob o nome de Neo Zeed, sequestraram sua noiva e assassinaram seu mestre, essa é a trama de The Revenge of Shinobi.
Mais uma vez os resultados foram bastante dentro do esperado e a Neo Zeed foi mais uma vez massacrada por um ninja full pistola vestido de branco.
Shinobi vs os samurais metaleiros batendo cabelo |
Bom, agora você deve estar pensando que, pelo menos agora, esses caras aprenderam sua lição e resolveram deixar qualquer ninja em paz e fazer suas punkarias longe de ninjas ou cidades onde o prefeito não consegue levantar um carro com as mãos, certo?
Para grande surpresa de todos, sim. Foi exatamente o que eles fizeram. Os sobreviventes da Neo Zeed (que por sua vez eram sobreviventes da Zeed original) começaram a reconstruir sua organização de punks malignos bem longe dali, no canto deles, sem incomodar ninguém com suas punkarias malignas. Ser massacrado duas vezes ensina lições a qualquer um, até mesmo punks. Eles não sequestraram ninguém, não mataram ninguém, só estavam no canto deles punkeando e fazendo a contabilidade da Nova Neo Zeed.
Avante, Rocinante! Existem inúmeros ninjas e pipas a serem pisoteados! |
E tudo teria acabado bem, não fosse que o nosso bom e velho camarada Joe Musashi um dia estava deletando seus perfis em redes sociais porque ele é um homem bom e decente, quando lhe ocorreu a sensação que tudo estava muito quieto e fazia muito tempo que ele não ouvia falar da Neo Zeed. Assim sendo, nosso sedento de sangue herói ninja parte em uma jornada para massacrar o que restou da Neo Zeed apenas porque é isso que ele faz, e essa é a história do jogo. Te fode aí punkão.
Tramas de jogos dos anos 90 são as melhores ou o que?
Sucessor de Togakuri, ninja olímpiada Shinobi! |
"Shinobi III: O Retorno do Mestre Ninja" é frequentemente considerado o melhor da série, e não é dificil entender o porque. Como eu sempre digo, se um jogo faz apenas duas coisas (atacar e pular, nesse caso), é imprescindível que essas duas coisas sejam satisfatórias de se fazer e neste caso elas são bastante.
Eliminar seus inimigos é divertido, faz um som satisfatório quando eles morrem e tudo, e os saltos melhoraram desde o primeiro jogo e agora eles estão na velocidade e peso ideais para você sentir que está jogando com um mestre ninja, capaz de desviar de balas, shurikens e posteres autografados do Pedro de Lara. Com a adição de um comando para correr (e um ataque cortante no fim da corrida), a jogabilidade ficou ainda mais rápida e fluída - uma das maiores falhas reais de seu antecessor.
Também foram adicionados movimentos novos, dando repertório ao seu ninja e abrindo opções de estratégias diferentes para enfrentar inimigos e chefes - mantendo o jogo mais interessante do que se fosse apenas "ir para a direita e atirar shurikens", como nos jogos anteriores. Agora você pode defender projeteis a qualquer momento (ao contrário de depender de um power-up para isso, como em The Revenge of Shinobi), e uma voadeira para se aproximar de seus inimigos com velocidade, fúria e dor (preferencialmente da parte deles).
Estranhamente, entretanto, é preciso digitar um truque para poder reconfigurar os botões desse jogo. Porque essa não é uma opção acessível desde o começo é algo que está além de mim responder (ou da Sega, ela não sabe explicar porque faz a maior parte das coisas que ela faz).
Felizmente, na parte de gameplay a Sega sabia o que estava fazendo e não só Joe Musashi se tornou muito mais ágil, como vários elementos de gameplay foram "emprestados" de outra série de ninjas muito famosa: Ninja Gaiden. Agora nosso amigo Zé pode nas paredes e se pendurar nos tetos, além de ter um pulo duplo. Todas essas novas habilidades adicionam várias possibilidades ao level design, e que são bem exploradas.
Quicando pelas paredes, because i'm a motherfucking ninja! |
Explorar bem a possibilidade do gameplay é algo que a Sega faz competentemente aqui, e frequentemente ela se esforça para adicionar desafios interessantes ao jogo. Não é apenas "ir para a direita e atirar shurikens", eles realmente tentam coisas novas aqui para sempre manter o gameplay interessante.
Esta fase, por exemplo, se passa inteiramente em pedras que estão caindo e você tem que saltar de uma para outra para nunca chegar ao fundo da tela, senão você morre. Enquanto luta contra punks mutantes, porque uma queda de vários quilometros de altura jamais desencorajou punk nenhum e não é hoje que começaremos!
Ou como nesta fase, em que o chefe do fundo fica com essa mira andando na tela enquanto você faz a fase normalmente, e se ela encostar em você, ele dispara uma rajada que causa dano.
A dificuldade também foi acertada também, já que o Shinobi original era adaptado de um arcade - ou seja, especificamente desenhado para comer o maior número de fichas no menor tempo possível. Aqui não, embora não haja um passeio no parque - especialmente na fase final, onde você precisa colocar todas as suas habilidades acrobáticas à prova para pular entre paredes e tetos eletrificados estreitos - o jogo é bastante jogavel.
Uma coisa que a Sega adora fazer é fazer jogos com a camera colada no seu personagem para mostrar o quanto os sprites são grandes e bonitos, só que na maior parte do tempo eles não entendem que isso ferra completamente o gameplay. Aparencia acima de conteúdo, é como a Sega rola.
O problema de usar personagens grandes na tela é que quase qualquer pulo vira um salto de fé, já que não tem distancia suficiente na tela para mostrar para onde você está indo. Outro problema é que se o seu personagem é um grande demais, ele se torna um alvo fácil e desviar dos ataques se torna muito dificil - quando não completamente impossível.
Shinobi 3 decide apenas resolver esses problemas. Em primeiro lugar, todas as fases que envolvem salto (não são todas) são construídas em ascendencia - ou seja, você começa de baixo e vai para cima. Isso é muito importante porque mesmo que você caia, não é um salto de fé porque você sabe o que tem embaixo (você veio de lá!). A outra coisa que eles resolveram foi que, dando um comando de defesa e agilidade suficiente para o seu ninja, você tem recursos para desviar ou defender os projeteis jogado contra você.
Resolvidos esses problemas, não há nada a ser dito contra as escolhas de camera da Sega! É pra glorificar de pé, igreja!
Uma coisa que eu espero de continuações é que elas sejam uma evolução do gameplay (dado que narrativa era praticamente inexistente nessa época) do jogo anterior, implementando o que funcionou no genero e o que deixou de funcionar desde o lançamento do jogo original. Uma continuação adequada deve ser mais do que apenas novas fases do mesmo jogo, e sim uma evolução natural de ideias.
É por isso que videogames são a única midia onde por padrão é esperado que as continuações sejam melhores que o original e, nesse sentido, Shinobi 3 atende todos os requisitos de ser não apenas uma excelente continuação, como um dos melhores jogos do Mega Drive.