sexta-feira, 19 de setembro de 2025

[#1557][Mar/2000] THIEF 2: The Metal Age


Thief II: The Metal Age é o tipo de review mais difícil de escrever. Por quê? Porque é um dos melhores jogos de stealth já feitos mas não tenho um monte de coisas espirituosas para destrinchar sobre ele. Este não é um jogo que reinventa a roda, e sim um que pega a roda de seu antecessor, dá uma boa polida e garante que ela continue rodando na maciota.

E eu não discordo do que foi feito aqui. O THIEF: The Dark Project original não inventou o stealth, mas trouxe tantas coisas que ainda são usadas hoje que você pode muito bem dar crédito a ele. Claro, títulos anteriores como METAL GEAR SOLID e TENCHU: Stealth Assassins ​​vieram antes e lançaram as bases, mas foi THIEF: The Dark Project foi quem traçou a planta baixa do que um jogo de stealth deveria ser. Luz e sombra não eram apenas para gráficos bonitos — eram mecanicas que separavam vida ou morte. O som não era apenas um floreio atmosférico — era seu inimigo ou seu escudo. O resultado foi um projeto tão eficaz que mesmo títulos modernos como Dishonored, Splinter Cell e até mesmo o reboot da série Hitman devem metade de seu DNA as ladinagens do nosso mano Garrett.

Então, aqui está a pergunta: como você faz a sequencia de um jogo que já reescreveu o gênero? A resposta é bastante simples, na verdade: você não conserta o que não está quebrado. E foi exatamente isso que a Looking Glass Studios fez com Ladravas 2: A Era do Metaaaaaal. Eles simplesmente se concentraram no que funcionava, refinaram as mecânicas, expandiram o design das missões e entregaram uma sequência que parece menos uma aposta e mais um mestre artesão aperfeiçoando suas ferramentas.

O ethos de design da Looking Glass Studios em The Metal Age não é exatamente física quantica de explicar: "e se cortassemos o que não ficou legal no primeiro jogo e nos concentrarmos nas partes que as pessoas realmente gostaram?". Eu disse que era simples. Mas então, eu estou rodando nessa indústria há tempo suficiente para saber que "bom senso" é mais uma relíquia arcana trancada em uma masmorra que ninguém lembra como chegar.

Beleza, então vamos fazer a lição de casa básica: o que não funcionou muito bem no primeiro Thief? Bem, o jogo se tornou lendário graças ao seu sandbox de "furtividade social" — entrando sorrateiramente em castelos, propriedades nobres e catedrais, roubando cada bugiganga que sua Bag of Holding™ sem fundo pudesse carregar, enquanto fazia malabarismos com parâmetros de missão e objetivos secundários que pareciam ter sido tirados diretamente de GOLDENEYE 007. Essa é a parte boa. É isso que as pessoas ainda amam em Thief: a emoção de ser um fantasma na casa de outra pessoa.

Mas tem a outra parte, a parte em que o jogo esquece que se trata de sombras e silêncio e decide tentar ser um FPS/hack'n slash da Shopee. Invadir cavernas infestadas de monstros, destruir demônios, equeletos toscos e etc — está tudo lá, e é tão esquecível que a maioria dos jogadores reprimiram essas memórias, realmente esquecendo dessa parte tosca do primeiro THIEF: The Dark Project.


Então, o que a Looking Glass fez pela sequência? Eles fizeram a pergunta mais lógica imaginável: "E se a gente, tipo, só não fizesse isso?" E, honestamente, isso é metade do brilhantismo de The Metal Age. Ele sabe exatamente no que é bom e se apoia nisso. Mais uma vez, bom senso pode não parecer glamoroso, mas nesta indústria é um item de luxo — raro, caro e geralmente esgotado.

Em termos de jogabilidade, Thief II se aproxima muito do seu antecessor. A mecânica principal é praticamente a mesma e, sim, o combate continua desajeitado, péssima resposta e completamente miserável. Mas aqui está a coisa: isso é intencional. Você não é Conan, o Bárbaro, mas Garrett, o Ladrão. Se você precia brandir sua espada como um lenhador bêbado, a coisa já deu errado. O objetivo é evitar o combate por completo e, nesse sentido, The Metal Age realmente lhe faz um favor. Ao contrário do jogo anterior, aqui raramente vc é forçado a um confronto direto. Se você acaba em uma luta de espadas, não é porque o jogo queria que você estivesse lá — é porque você fez merda. O combate é uma punição, não uma recompensa, o que parece perfeitamente alinhado com a filosofia do jogo.

Quanto aos pontos negativos, bem, tem que Thief II não bota fogo no mundo com novidades. Sejamos honestos, ele é mais um pacote de expansão de luxo para o primeiro jogo, com as partes ruins removidas. Tudo o que você aprendeu em THIEF: The Dark Project ainda se aplica aqui. Luz, sombra e som são a santíssima trindade da sobrevivência. Fique longe da luz, cuidado com o barulho e esteja sempre atento ao que está sob seus pés. Vc faz menos barulho pisando no tapete do que batendo suas botas no marmore, e o jogo até te dá uma flecha mágica que faz crescer musgo para vc pisar sem gerar barulho dos seus passos. As ferramentas do ofício são praticamente as mesmas de antes (incluindo sua sempre confiável flecha d'água para apagar tochas), permitindo que você passe batido, distraia ou — se realmente precisar — ​​apague os inimigos pelas costas. E, claro, o saque ainda se converte em dinheiro para comprar equipamentos extras antes das missões, reforçando o ciclo de risco e recompensa.


Dito isso, The Metal Age adiciona alguns novos recursos para evitar que o kit de ferramentas de Garrett pareça sem graça. Ovos de Frogbeast, por exemplo, eclodem em pequenos monstros kamikaze que explodem nos inimigos. A Orbe de Reconhecimento oferece uma spy cam primitiva que você pode jogar nos cantos e os flares permitem iluminar áreas totalmente escuras sem desperdiçar tochas preciosas, e as novas poções expandem suas opções de maneiras inteligentes: Queda Lenta para descidas graciosas, Invisibilidade para aqueles momentos de "saída da prisão" quando tudo dá errado. Nada disso reinventa o jogo fundamentalmente, mas adiciona sabor, variedade e tempero suficiente para fazer Garrett se sentir um pouco mais próximo de um proto-agente da Splinter Cell.

A história de Thief II é exatamente o que você esperaria da série: A Cidade — com letras maiúsculas — é uma pesadelo urbano vitoriano imundo onde a magia convive com o steampunk, um sem fim de becos, sombras e assassinatos baratos. É a única cidade da qual se ouve falar, como se o resto do mundo não existisse ou não importasse. Dentro de seus muros, três facções disputam constantemente o domínio: os manipuladores e misteriosos Guardiões, os zelosamente tecnológicos Hammeritas e os pagãos adoradores da natureza que rezam para seu deus do caos e das coisas selvagens, semelhante a Pã. E no meio disso tudo está Garrett, ladrão mestre e cínico profissional. Ele não se importa nem um pouco com política, conflitos divinos ou "o destino do mundo". Tudo o que Garrett quer é pagar o aluguel, roubar coisas brilhantes e ser deixado em paz. Muito obrigado.

O problema é que o destino não se importa com o plano de aposentadoria de Garrett. Após os eventos do primeiro jogo, onde ele salvou a cidade a contragosto, impedindo o renascimento do deus pagão Trickster, os Hammeritas ganharam momentum. Eles cairam duro em cima dos pagãos, forçando-os a se esconderem e desencadeando um conflito de guerrilha. Garrett, naturalmente, deu de ombros e voltou aos seus roubos noturnos. Não era sua guerra, não era seu problema.

Pelo menos, não até que se tornasse seu problema. Os Hammeritas apertaram seu cerco, enchendo as ruas com guardas mecânicos e monstruosidades movidas a vapor que tornavam a ladroagem uma profissão muito mais arriscada. Enquanto Garrett tenta se esquivar do conflito crescente, ele se depara com algo maior: um cisma dentro da fé Hammerita. Dele emergem os Mecanistas, uma ramificação radical liderada pelo fanático Karras cuja visão da "Era do Metal", essencialmente uma assimilação Borg de toda a vida em máquinas distorcidas.

E nesse ponto, Garrett não pode apenas ignorar isso. Como disse certa vez o guaxinim mais improvável da galáxia: "Por que você quer salvar a galáxia? Porque eu sou um dos idiotas que vivem nela!". Garrett pode não dar a mínima para as tretas políticas da Cidade, mas ele meio que precisa que continue existindo uma Cidade para morar nela.

No geral, eu gosto muito do estilo narrativo da Looking Glass. Quase nunca se tem um lore dump expositivo da história que outros jogos adoram enfiar na sua cara. Em vez disso, Thief II te dá a chance de pegar o que está rolando ouvindo das sombras — trechos de fofocas entre guardas, falas perdidas de nobres ou conversas sussurradas por portas entreabertas. Quando alguém finalmente explica algo para Garrett, não é porque os roteiristas sentiram a necessidade de segurar sua mão — é porque o próprio Garrett já cruzou a linha de "não é problema meu" para "ok, eu realmente preciso saber disso". É sutil, orgânico e bastante elegante.


Graficamente, nada mudou muito desde o primeiro jogo — ainda é a mesma Dark Engine por baixo dos panos —, mas a ambição no level design aumentou bastante. Os mapas são enormes, extensos e repletos de detalhes, oferecendo inúmeras oportunidades para exploração, improvisação e, claro, roubo. E a maneira como Thief II lida com a dificuldade é uma coisa bem interessante: como o combate deliberadamente não importa, aumentar a dificuldade não faz com que inimigos ataquem com mais força ou guardas virem esponjas de bala. Em vez disso, dificuldades mais altas adicionam novos objetivos, restrições mais rígidas e parâmetros de missão mais exigentes. É um dos raros jogos que eu realmente recomendo jogar no nível de dificuldade mais alto possível porque aí sim dá pra tirar tudo do jogo.

Mas eu falava do level design: apesar de rodar na mesma engine, Looking Glass a otimizou para incluir mais NPCs, mais eventos scriptados e mais vida. Algumas missões — como o famoso roubo pelos telhados na fase "A Alma da Festa" — parecem surpreendentemente modernas, prenunciando os cenários urbanos de stealth abertos de Hitman e até mesmo Assassin's Creed. Para um jogo lançado em 2000, ser tão instantaneamente reconhecível como seu ancestral espiritual é simplesmente impressionante. The Metal Age não foi apenas mais uma sequência: foi um vislumbre do futuro dos jogos stealth.


E... é isso. Thief II é um jogo extremamente delicioso de jogar, mas quase suspeitosamente fácil de explicar. A Looking Glass não pensou muito sobre isso — eles apenas perguntaram: "O que as pessoas amaram no primeiro jogo?" e ​​então entregaram exatamente isso. Gostamos dos furtos urbanos, da invasão furtiva de mansões e catedrais. Gostamos de Garrett, o babaca eternamente descolado e indiferente que só quer ser deixado em paz, mas de alguma forma continua sendo arrastado para salvar o dia. Gostamos do cenário steampunk, da atmosfera sinistra, dos gadgets inteligentes. O que não gostamos foram as explorações de masmorras de RPG baratas, a matança desajeitada de monstros e a destruição de esqueletos que pareciam sobras de outro jogo completamente diferente.

E a Looking Glass, que Arceus os abençoe, simplesmente disse: "Anotado. Tá na mão, mano." Sem "mas". Sem letras miúdas. Apenas mais do que você queria e menos do que vc não queria. É tão simples, tão óbvio, tão dolorosamente senso comum que, quando terminei o jogo eu ainda fiquei esperando que hora a pegadinha ia vir. Jogos nunca te dão o que você quer desse jeito. O universo não funciona assim. Mas não — Thief II é realmente apenas isso mesmo. É a sequência que ouviu o feedback, cortou o que era desnecessário e dobrou no que era bom. E mesmo depois de todos esses anos, ainda parece uma das decisões de design mais inteligentes que qualquer estúdio já tomou.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
EDIÇÃO 156 (Outubro de 2000)


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EDIÇÃO 064 (Maio de 2000 - Semana 2)