Envelhecer é viver o processo de descobrir que seus heróis na verdade eram idiotas. Quando eu era adolescente — décadas atrás, quando os dinossauros ainda vagavam pela Terra — eu realmente acreditava que a Working Designs era a editora mais legal do mundo. Eles não estavam apenas localizando jogos, eles estavam selecionando os jRPGs mais estilosos para o Ocidente, aprimorando-os com suas traduções características, cheias de atitude e piadocas.
O primeiro título da Working Designs que joguei foi LUNAR: The Silver Star Story. Eu me apaixonei na hora — não apenas pelo jogo em si, que continua sendo uma história calorosa e humana até hoje, mas pelo que eu considerava na época os floreios "descolados" da tradução. As piadas modernas, as alusões à cultura pop, as referências que me faziam sentir como se os personagens estivessem no mesmo mundo em que eu vivia. Para um adolescente como eu era na época, isso era puro ouro.
E claro, eu estava ciente das críticas já naquela época. Aqueles que diziam que a Working Designs foi longe demais, que a acusaram de querer roubar os holofotes dos desenvolvedores para si. Mas ignoorava essas opiniões como puristas chatos, o tipo de pessoa que reclama só por reclamar. Por que criticar algo que tornava os jogos mais divertidos? Pelo menos, era assim que eu via.
Mas o tempo tem um jeito de transformar entusiasmo em perspectiva. Ao longo desses longos anos analisando jogos para este blog, cruzei com a Working Designs mais do que algumas vezes, e a cada encontro eu gostava menos deles. Aos poucos eu comecei a ver as antigas críticas sob uma nova luz. De repente, as rachaduras eram impossíveis de ignorar. Sim, encaixar uma referência a Star Wars em um discurso sincero sobre a cidade natal perdida de um personagem quebra o ritmo e é irritante. E sim, mexer com balanceamento e mecânicas só porque "você sabe mais do que os desenvolvedores" cheira mais a ego do que prestar um serviço aos jogadores. É tipo a Mona Lisa sair em uma turnê mundial e os curadores da exposição de Nova York decidirem que a obra de Da Vinci poderia receber um "toque moderno" — talvez uns óculos escuros e um pouco de maquiagem de e-girl para mantê-la interessante.
Então quando eu cheguei a "Vanguard Bandits" e vi o logotipo da Working Designs estampado na capa, minha primeira reação não foi de entusiasmo, nem de nostalgia, nem mesmo de curiosidade. Foi apenas um longo suspiro, seguido por um pensamento cansado: I'm too old for this shit.
Mas vamos começar do começo. Vanguard Bandits é um RPG tático japonês lançado em 1998 com o nome Epica Stella. Por que a mudança de nome? Bem, de acordo com o manual, a Working Designs brincou que não conseguia resistir a ir full Marlon Brando e gritar "Stellaaaaaaa!" toda vez que via o título. A segunda ideia foi chamá-lo de Detonator Gauntlet — o que, aparentemente, levou a US Manga Corps e a Midway a ligar para eles e dizer: "Sério, mano?". E assim ficou com a terceira opção,Vanguard Bandits.
Em essência, VB é um RPG tático. Você sabe como funciona: você move unidades por um tabuleiro, um número definido de quadrados por turno, escolhe ataques, usa itens e assiste às animações. Se você jogou SHINING FORCE: The Legacy of Great Intention no Mega Drive — ou qualquer RPG tático desde então —, sabe exatamente o que esperar em termos de mecânica. É o o RPG raíz, onde números, posicionamento e paciência decidem seu destino.
Então, o que diferencia este RPG tático não-Stellaaaaaaa de um "Shining Force VIII: Sega Ainda Tem Contas a Pagar" da vida? Bem, a estrutura da narrativa — que pega bastante emprestado de SHINING FORCE 3: Scenario 1 - The Titan of Aspia (então talvez a piada não tenha sido tão terrível quanto eu pensava). A história se desenrola no continente de Eptina, uma terra marcada por séculos de guerras por território, comércio e religiões. No meio de tudo isso, arqueólogos do Reino de Pharastia tropeçam nos restos de robôs blindados gigantes, chamados ATACs (All Terrain Armored Combatants). Essas máquinas são controladas diretamente pelos pensamentos do piloto, tornando-as a arma suprema de guerra.
Naturalmente, Pharastia usa os ATACs para dominar o continente e impor a paz a força. Mas o Império — porque, claro, o nome é "Império", a criatividade é opcional aqui — responde instigando um golpe e mergulhando o Reino em uma guerra civil. Você joga como Bastion, o príncipe banido do Reino, que embarca na clássica jornada de reconquistar sua terra natal, reunir seus companheiros e toda essas coisas reileãozisticas de Círculo da Vida.
Agora é aqui que as coisas ficam interessantes. Ao contrário da maioria dos RPGs da sua época, Vanguard Bandits se tem duas rotas possíveis dependendo de suas escolhas. Permaneça no Reino e você seguirá uma história, mas se suas escolhas te levarem a ver o lado do Império (especialmente porque sua terra natal em seu auge não era flores e arco-íris realmente) você vivenciará outra. Isso não apenas lhe dá duas perspectivas sobre a mesma guerra, como cada ramificação se divide em múltiplos finais: o caminho do Reino muda com base no moral geral do grupo, enquanto a rota do Império depende dos relacionamentos de Bastion com duas personagens femininas importantes. E há uma terceira rota secreta — mas... falarei sobre isso mais tarde.
Só que as coisas pioram mais quando você olha além da história e se aprofunda na jogabilidade. Porque a Stella Épica tinha um sistema de level up bem curioso que o diferenciava da rotina usual de "atributos aumentam, números aumentam". Funciona assim: por padrão, cada personagem tem apenas ataques básicos. Mas, ao subir de nível, você ganha pontos que podem ser distribuídos entre diferentes atributos — Power, Dexterity, HP, Weapon Skill, Defense e assim por diante. Naturalmente, aumentar esses atributos torna seu personagem melhor: mais Destreza melhora a evasão, mais Power aumenta seu dano e mais HP mantém você vivo por mais tempo. O normal.
Mas aqui está a diferença: combinações específicas de atributos desbloqueiam habilidades especiais — sejam técnicas de combate, vantagens passivas ou até mesmo magias. Por exemplo, para desbloquear a habilidade "Segundo Ataque" (que, como o nome indica, permite atacar duas vezes em um único turno), você precisa de um atributo BASE 16 e AGILITY 10. Quer a magia "Ice Shards"? Destreza 8 e Defesa 6. E assim por diante.
Agora, a pergunta que provavelmente vc está se fazendo é: como diabos você vai saber quais combinações desbloqueiam quais habilidades? Bem, o manual japonês original de Epic Stella tinha uma seção dedicada a esse sistema. Ele não revelava os números exatos dos atributos, mas dava uma ideia geral de quais atributos você precisaria focar para obter certos tipos de habilidades. Não era perfeito, mas o suficiente para te guiar. E sim, eu olhei o manual japonês do jogo. Não, eu não tenho nada melhor pra fazer da vida.
E então a Working Designs teve uma ideia diferente.
Em vez de traduzir essa seção, eles simplesmente... cortaram. Sumiram. Apagaram. Mas não se preocupe! Eles tinham uma solução: anunciaram que estavam vendendo um guia de estratégia separado — por dinheiro extra, é claro — onde você poderia encontrar todas essas informações vitais. Sim, as mesmas informações que vinham com o manual original em japonês, convenientemente removidas para que pudessem te vender um livro. Não é legal da parte deles?
Olha, eu sou um homem paciente. Um surfista californiano sendo totalmente tubular no meio de um reino medieval? Tudo bem, eu aceito isso. Uma referência aos escandalos do Bill Clinton em uma história sobre elfos e impérios? Eu vou sobreviver. Mas quando você começa a fazer palhaçadas nível Electronic Arts com as mecânicas do jogo, é aí que eu traço a linha, Working Designs.
Felizmente, no ano 2000, a internet já era uma realidade. GameFAQs existiam, fans shrines existiam e você podia desenterrar as informações que a Working Designs tentava te arrancar uma grana extracom um paywall. Então o jogo não foi completamente arruinado. Mas não vamos medir palavras: o fato de a WD ter cortado deliberadamente as orientações essenciais de jogabilidade do manual para vender um livro de estratégias separado foi uma atitude extremamente mesquinha. Tipo muito mesmo.
E, no entanto... esse não foi o fim do seu reinado de terror. Ah, não, nem perto. Porque, aparentemente, a Working Designs decidiu que mexer no manual não era suficiente — eles também precisavam mexer no jogo em si.
Então, o que eles fizeram? Inventaram um recurso totalmente novo do nada: o sistema "Cerco". Com essa adição, você não só recebe dano bônus ao atacar um oponente flanqueado (algo que alguns RPGs Táticos já faziam, até mesmo FINAL FANTASY TACTICS), mas se uma unidade for cercada e atingida pelo menos três vezes em um turno, ela fica atordoada. Parece interessante, certo? Certo... exceto um pequeno problema: a Human Entertainment, a verdadeira desenvolvedora do jogo, nunca projetou seus sistemas em torno dessa mecânica. Ela não existe no Epica Stella original.
🔥 Localizações controversas pela Working Designs
Jogo | Polêmica | Detalhes |
---|---|---|
LUNAR: The Silver Star Story | Tradução irreverente | Incluiu piadas modernas e referências à cultura pop que mudaram o tom emocional da história. |
POPFUL MAIL: Magical Fantasy Adventure | Alterações de dificuldade | Versão para Sega CD teve mudanças drásticas na dificuldade, tornando o jogo mais frustrante. |
MAGIC KNIGHT RAYEARTH | Atraso e mudanças | Lançado com anos de atraso e recebeu uma tradução cheia de piadas destoantes do anime original. |
SILHOUETTE MIRAGE: Reprogramed Hope | Mecânicas alteradas | Modificaram o sistema de economia do jogo, tornando-o mais punitivo e desequilibrado. |
ALBERT ODYSSEY GAIDEN | Humor fora de contexto | Adição de piadas sexuais e trocadilhos que não existiam no original. |
E é aqui que minha pressão arterial dispara. Você não pode simplesmente jogar mais uma mecânica em um RPG tático bem ajustado como se socar mais japonês no trem das 18h30 na Estação de Tóquio. A IA não foi programada para lidar com isso. A curva de dificuldade não foi balanceada para isso. Quando os desenvolvedores definem valores de dano, níveis de defesa ou requisitos de habilidade, esses números não são (geralmente) tirados da bunda. Eles vêm de testes, iterações e de uma filosofia de design — mesmo que imperfeita — que pertence aos desenvolvedores.
E se os devs cagarem no balanceamento do jogo, ainda sim é um erro que cabe a eles cometer. O design deles. O jogo deles. Não da Working Designsseu. Você não pode simplesmente rabiscar uma mecânica em um guardanapo e socar ela no jogo a lá Frankenstein. Se você quer tanto ser um designer de jogos, Working Designs, então vai e faz o seu próprio jogo. Não sequestre o trabalho de outra pessoa e jogue seus homebrews nele como uma partida de RPG no porão de alguém. E porra, eu não acredito que preciso mesmo ter que explicar isso. Por tudo que é sagrado e profano — não adicione mecânicas de jogo por capricho num jogo que já está pronto!
O resultado, claro, é completamente ridículo. Depois que você domina a mecânica "Surround", o jogo se torna um passeio no parque. E se você não dominar, a CPU vai esfregar o chão com a sua cara. O que deveria ser um RPG tático sólido e equilibrado se transforma em um monstro sequestrado pela interferência da Working Designs.
Sinceramente, eu estou sem palavras. Em todos os meus anos de jogo, nunca vi um título tão completamente eviscerado em seu lançamento ocidental. Eu costumava pensar que a Sega da America aumentar a dificuldade em STREETS OF RAGE 3 — transformando o excelente Bare Knuckle 3 em um exercício de frustração — era o ápice da localização ruim. Mas não. A Working Designs olhou pra isso e disse: "Segure minha cerveja". Em seguida eles deram um tapa na cara da Sega e gritaram: "É ASSIM que vocês estragam um jogo, amadores!". A essa altura, eu queria poder dar um tapa na cara deles.
Então, resumindo: não há um único aspecto de Vanguard Bandits que a Working Designs não tenha conseguido arruinar. Informações vitais sobre a jogabilidade escondidas atrás de um paywall. Uma tradução tão abarrotada de piadas e autoindulgências que beira o incompreensível. Aquela "terceira campanha" que eu mencionei... foi reduzida a uma série de stand-ups ruins, com o roteiro original enterrado sob piadas que ninguém pediu. E, claro, as infames mecânicas "inéditas" que sequestram todo o equilíbrio da jogabilidade. E olha que eu não estou nem dizendo que Epica Stella era uma obra-prima esquecida. Era um RPG tático funcional mas esquecível. Mas a Working Designs decidiu que precisava de "apimentar as coisas" — e o resultado final é um dos erros mais espetaculares que já vi.
Meu veredito? Vanguard Bandits deveria ser classificado como +18. Não por causa de algo no jogo em si, mas por causa da pornografia que a Working Designs cometeu neste título miserável. Moral da história: eu não gosto mais da Working Designs.