sábado, 14 de maio de 2022

[#883][SAT] MYSTARIA: The Realms of Lore (no Japão "Riglord Saga" e depois relançado no ocidente como "Blazing Heroes") [Julho de 1995]


Cara, eu já disse isso aqui antes, mas eu realmente amo RPGs táticos. Tem alguma coisa na combinação entre videogame e boardgame que absorve meu cerebro de maneira tal de modo que eu passei mais de 20 horas jogando um jogo que no máximo, no máximo é nota 7. Isso sendo generoso.

Com efeito a coisa mais interessante a respeito de Mystaria: The Realms of Lore é que, além de não ter lore nenhum apesar do nome, ele teve que ser relançado seis meses depois com o nome de Blazing Heroes apenas porque ninguém na Sega se ligou que "Mystaria" já era um nome registrado da Wizards of the Coast - e com efeito, se você jogar "Mystaria" no google vão aparecer resultados apenas sobre D&D - que tem até um videogame sobre isso.

Então a Sega e a Wizards chegaram a um acordo: a Sega poderia terminar de vender os jogos que eles já tinham em estoque, mas a próxima leva teria que ter outro nome. Por isso o jogo foi relançado com o nome de Blazing Heroes... que é um nome bem genérico da porra, mas suponho que é bem adequado ao jogo.

Pra começar, na história desse jogo a Sega claramente colocou tanto esforço quanto colocou para pesquisar se podia usar o nome Mystaria. O que rola aqui é que um mal ancestral e maligno que odeia o bem reencarna de tempos em tempos na forma de um vilão vilanesco vilaniante. Para derrota-lo, nosso herói precisa recrutar uma party de 12 guerreiros pq... hã... pq da ultima vez que ele apareceu um grupo de 12 sentou o cacete nele, então pra não correr riscos melhor fazer tudo igual da última vez.


E é isso, basicamente. Você começa com uma party de 5, precisa recrutar mais 7 caboclos e assim que  o fizer pode rushar para sentar a chulapa no Tinhoso. Sem meio termo, sem coré-coré, é reunir sua galera e ir pro pau, cabou o jogo.

O que, como você pode imaginar, significa que o jogo é uma coleção de "Mcguffin no Vilarejo da Semana", ou MVS como eu chamo. Eu falei disso a bem pouco tempo atrás em TRIALS OF MANA e Mystaria Blazing Heroes ilustra bem o quão genérica e sem sal a formula de "vai numa vila genérica, resolve o problema genérico dela, coleta o que você precisa coletar, repete e enxagua".


Acerca de narrativa e personagens, meio que se aplica tudo que eu disse a ARC THE LAD, então meio ignora esses temas. Só não vou dizer que o jogo é essencialmente o ARC THE LAD do Saturn pq eu queria muito que esse jogo pelo menos tivesse a organização de menus e interface daquele jogo, pqp POUTAQUEOPAREO eu juro que me senti jogando SHINING FORCE: The Legacy of Great Intention tudo de novo.

Olha caras, eu realmente adoro SHINING FORCE: The Legacy of Great Intention, mas eu não desejaria aquela interface de menus e gerenciamento de itens para o meu pior inimigo e de lá pra cá parece que a Sega não aprendeu nada pq Mystaria Blazing Heroes é tão arcaico quanto. Você termina o jogo com 12 personagens e é terrível gerenciar os itens dele, quando você pega algum item ele equipa em quem, comprar e vender itens em lojas, tudo é terrível. Esse jogo só não acabou com a minha sanidade pq pelo menos os itens são compartilhados, se fosse que nem SF e cada item ficasse com personagens especificos e vc tivesse que procurar as coisas no inventário individual de cada um eu teria cometido um sabaku, na moralzinha.

Isso sendo dito, equipar e usar as skills não é realmente muito melhor que isso também. Mas puta la mierda Sega, custava colocar um tooltip na parte de baixo da tela dizendo o que cada skill equipada faz? São 9 skills que dá pra equipar para 12 personagens, e os nomes são abreviados ainda por cima! É pedir muito pra vc me ajudar a lembrar qual a diferença entre um ARW SHT, STR SHT ou um LGT SHT?


SHT pra vc Sega, me ajuda a te ajudar!

DO JEITO QUE VC ESTÁ FALANDO PARECE REALMENTE TERRÍVEL, COMO VC AGUENTOU MAIS DE VINTE HORAS DISSO?

Então, essa é a coisa: apesar dos melhores esforços da Sega para me enlouquecer na interface pré-histórica e da inexistencia de narrativa ou personagens... o jogo na verdade é bem gostosinho até.

Pra começar, um dos aspectos mais respeitáveis de Mystaria Blazing Heroes é que ele adereça uma reclamação comum dentro do gênero RPG Tático, de que as batalhas demoram muito. Aqui não. Embora o número de inimigos por batalha possa chegar a vinte para o seu grupo máximo de seis, os combates são rápidos e dinamicos, a luta não parece arrastada.

Jogo vc podia ao menos me dizer a energia de quem eu selecionei como algo pra decidir se vale a pena atacar/curar sem eu precisar desmarcar apertar um botão e então andar pelo mapa pra achar ele? Um pouco de praticidade, não é pedir demais

Adicionalmente, a maioria das habilidades dos seus personagens são muito poderosas e com muitas que atingem vários inimigos, então o jogo manda hordas de inimigos contra você mas te dá as ferramentas para você enfrenta-los. O resultado é que você sente que está jogando uma campanha de nível épico com heróis altamente poderosos não dando overkill nos inimigos mas enfrentando desafios a altura. É meio estranho dizer isso, mas de alguma forma o jogo lembra um feeling de Dynasty Warriors só que em um RPG Tático, onde seu bonequinho é superpoderoso mas é desafiado por hordas de inimigos e isso é cool, eu realmente gostei do feeling do combate.

Outra coisa que eu gostei muito nesse jogo é que a estrutura dele é bem diferente do que estamos acostumados no genero, a estrutura é incrivelmente livre. Depois de terminar as poucas batalhas iniciais, você pode explorar livremente quase todo o mundo à sua vontade. O objetivo, como eu disse, é reunir todos os doze membros do seu grupo, mas a ordem fica a seu critério. 


Alguns são mais difíceis de conseguir do que outros, mas no final é legal que você possa explorar o mundo (que não é tão grande, então vc não fica horas vagando atoa) para recrutar os pinta para sua party. Honestamente, estou surpreso com o quão diferente é essa estrutura, já que a maioria dos RPGs daquela época joga seguro e sem muita ambição no seu design.

Outra coisa que funciona muito bem aqui é que jogos de RPG Tático e morrem por seus personagens e habilidades, e nesse sentido Mystaria Blazing Heroes não decepciona. O elenco é grande, e os personagens cumprem bem suas classes: os tanques aguentam porrada e impedem que os inimigos avancem no mapa, os casters cagam magia, os healers mudam o rumo da batalha com suas curas e os arqueiros são snipers de elite. Pode parecer simples, mas vc ficaria surpreso em quantos jogos falham nisso e vc sente que está jogando com sempre o mesmo personagem, aqui o jogo faz uma diferenciação bem bacana nas classes, dando um gameplay bacana. 


A lista de habilidades é bem interessante (uma vez que você se entende com os menus, isso é), um herói pode até roubar habilidades de inimigos para distribuir entre seu grupo. Enquanto certas classes são mais representadas (arqueiros), há diversidade suficiente no elenco para fazer com que cada batalha pareça única.

Por mais que eu tenha gostado da mecanica, tem que ser dito que ninguém vai jogar Mystaria Blazing Heroes por seus valores de produção. Este é um jogo feio, não tem outra forma de colocar isso. Esse jogo já não era bonito em 1995, e definitivamente o tempo não foi gentil com ele. 

Dá pra ouvir o Saturn suspirando "please, don't" antes de ter que rodar esse efeito na tela

Mystaria usa sprites pré-renderizados em fundos 3D para tentar dar uma aparência elegante... o que funcionou muito bem em alguns títulos, como KILLER INSTINCT GOLD, mas aqui o resultado é só uma bagunça horrível na tela. A direção de arte é péssima e obviamente faz parte da geração que estava aprendendo a mexer em arte pré-renderizada. O terreno é detalhado, mas sofre de pixelização pesada que torna o jogo confuso de se ver às vezes. 

Mas o pior mesmo é tem que ser a taxa de quadros abaixo da média. Existem muitos efeitos legais de magia e ataques especiais que você consegue ouvir o Saturno engasgando e pedindo pra alguém fazer uma manobra de Heimlich nele, pq a taxa de quadros desaba tão baixa às vezes que o jogo praticamente para. Este é um jogo de primeira leva da quinta geração e mostra isso claramente.

Vou dizer que eu gostei do sistema de EXP nesse jogo: todos personagens que participaram da luta ganham a mesma coisa, quem não participou ganha metade. Isso diminui muito o grinding que Shining Force gera ao dar XP pelo ataque individual. E aprender novas skills conforme você usa de uma categoria (magias de cura abrem novas magias de suporte, defesa dá skills de defesa, ataque ranged etc) é bem legal


No fim, Mystaria Blazing Heroes foi um bom treino para o jogo que a Sega REALMENTE queria fazer e investiria pesado suas fichas: Shining Force 3. Ainda sim é um jogo okayish que não exige tanto grinding quanto você poderia esperar da época (embora o primeiro Shining Force seja mais elegante nisso de leveling, verdade seja dita), que se tivesse mais atenção em tudo que cerca o gameplay em si. Jogar o jogo em si é legal, pena que tudo ao redor dele é tão qualquer nota que meu deus...

Nota 7.

MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 026 (Abril de 1996)