Sabe uma coisa que eu não consigo pegar o porque ainda tem tanto apelo?
AS PESSOAS FICANDO DE PÉ NA FILA PRA EMBARCAR ANTES NO AVIÃO QUE VAI SAIR NA MESMA HORA DE QUALQUER JEITO?
Também. Mas nesse caso em particular eu estava pensando em fantasia medieval. Eu realmente falho em ver não apenas o grande "charme" de uma época sem saneamento básico, depilação, as mulheres eram literalmente um móvel da casa para fins legais e sociaos, e qualquer grupo de três bactérias já faziam você passar meses apodrecendo vivo antes de morrer aos 20 anos de idade. Não é um período romantico, se você quer saber a minha opinião.
E nesse contexto, eu sei que é um staple da fantasia a figura mágica messianica do rei que sozinho é responsavel por tudo que dá de certo ou errado em um reino, mas a verdade é que ser brasileiro te torna bem cínico a essas coisas. Um rei é um cara que manda porque ele força para isso, e só. Eu entendo que acreditar que "é o representante do povo" ou "o rei é um ser sagrado escolhido de Deus" é uma forma de fazer a pilula mais fácil de engolir, mas no fim se resume a "manda quem pode, obedece quem tem juízo".
E como dá para deduzir, eu não sou exatamente o maior fã do Rei Arthur.
Oh, ok, champs, vc tem suas tropas, vc tem força pra fazer e acontecer e isso é realmente muito bom pra vc, mas eu não vejo porque qualquer um que não seja você realmente deveria ficar emocionado com isso.
De qualquer forma, ainda hoje os contos de cavalaria tem uma grande influencia na cultura popular (porque afinal que graça tem ser dono da porra toda se você não vai arrotar como você também é de uma qualidade superior de homem?) e esse conceito de "honra" ainda vive através da fantasia medieval. Tanto que em 1991 a Capcom decidiu que havia demanda para lançar não um, mas dois arcades "sidescrolling hack'n slash beat'm up" para serem lançados sobre o tema não apenas no mesmo ano, mas no mesmo MÊS.
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Para surpresa de zero pessoas, a capa japonesa do jogo é muito mais legal. Deve ser a vibe de Jojo na arte. |
Estes dois jogos sendo
KING OF DRAGONS, que eu já falei aqui, e o outro é esse Knights of the Round. Qual a diferença entre eles? Ambos são porradinha com espada e fantasia medieval, mas grosso modo a diferença é que o primeiro é beeeeeeeem D&D com classes, dragões, monstros e a porra toda. Mas caso fantasia mais fantástica não seja a sua colher de açucar, a outra opção é essa pega mais pegada "pé no chão" da lenda arthuriana.
"Pé no chão" dentro do possível para um arcade de 1991, isso é.
Quando o arcade liga, a primeira coisa que aparece na tela é a espada Excalibur sendo cravada no chão. Eu não sou exatamente especialista nisso, mas desconfio que a lenda do Rei Arthur ficou famosa justamente pelo contrário, não? Tenho bastante certeza que todo o ponto da coisa é a espada sendo tirada... e que era uma pedra, mas suponho que esse detalhe seja de menor importancia.
Oh, mas ok, talvez eles estejam pensando em contar a história beeem do começo, eu acho?
Hã... ou não. Parece que a cena da abertura é mesmo o rei Arthur cravando e tirando a sua espada de um montinho de terra porque ele quer muito, muito mesmo esfaquear esse montinho de terra. Maldito seja!
Porém tão logo Arthur comete essa violencia geologica, ele é alcançado pela polícia do montinho que agora manda ele e seus parças recuperarem o Holy Grail pra prevenir a DESGRAÇA na Terra. A Inglaterra definitivamente opera com leis muito estranhas, líderes são escolhidos por mulheres molhadas dando espadas, juntar uma espada do chão te faz responsável por derrotar o Yaldabaoth, nada faz sentido. Bloody bollocks, m8!
KotR tem um sistema de personagens fixo: são três manches no arcade, cada um corresponde a jogar com aquele personagem. Se você colocar ficha no joystick da direita jogará com Arthur Pendragon, o famoso arthurito e personagem principal dessa história.
O engraçado é que o jogo é para até três jogadores, mas não é obrigatório jogar com o rei Arthur de modo que pode acontecer de dois jogadores usarem os outros personagens e no fim o Arthurzão só receber os créditos sem levantar um dedo. O rei da maciota.
De acordo com o flyer de fliperama, Arthur tem apenas dezessete anos de idade, mas eu não acredito nisso. Eu já vi o tipo de barba desgrenhada que garotos de dezessete anos podem lidar e os pelos faciais de Arthur são grandes demais para isso. Dadas as taxas de expectativa de vida na Idade Média, eu diria que ele tem mais sete anos, dez no máximo. Para propósito de beat'm up, Arthur é o personagem "equilibrado" do jogo entre força e velocidade.
Percival (ou Parceval, como o jogo as vezes decide chamar) é o personagens forte e lento do beat'm up. Não é um prefeito que dá suplexes, mas ele tem um machadão. Perceboy , o casto, é um jovem de coração puro e corpo de urso depilado. Ele carrega um machado em vez de uma espada, porque de que adianta usar uma espada se seu colega de equipe está usando a Excalibur? Você só vai se sentir o segundo melhor.
Lancelot é o mais famoso dos cavaleiros da Tavola Redonda, tendo inclusive seu próprio filme em 1995 sobre sua relação com o Rei Arthur e a Guinevere, se é que me entende. Quer dizer, ele é interpretado pelo Richard Gere. E sim, nesse filme o par romantico dele é a Julia (embora não Roberts porque ela não estava disponível, então pegaram a Julia Ormond).
Lanceboymagia é o personagem rápido e fraco do jogo, o que normalmente nos beat'm ups seria a personagem feminina. Só que a Capcom decidiu que tava numa fase sem mulherzinhas because mulherzinhas, de modo que tanto King of Dragons quanto Knights of the Round não tem personagens feminas. Temos Lanceboy!
E assim, nossos três bravos cavaleiros partiram em uma busca para encontrar o Graal que eles nunca viram e não têm ideia de onde encontrar. Você tem que sentir alguma simpatia por aquele pobre soldado da direita; ele não pode ter mais de quinze anos. Junte-se ao exército, eles disseram. Saquear algumas aldeias, será divertido. Claro que você vai acabar em um túmulo de indigente antes que seus testículos tenham descido totalmente, mas isso é chamado de Idade das Trevas por uma razão, garoto.
Se você já jogou qualquer beat'm up na vida, você sabe o que esperar em termos de jogabilidade. Dois botões, um para atacar e outro para pular. Pressionar os dois juntos executa ataques especiais que drenam vida e derrubam qualquer inimigo próximo. Atingir o mesmo inimigo algumas vezes com seu ataque normal resultará em um combo e por que estou explicando isso, você sabe como tudo isso funciona - viaje pelo reino, cortando qualquer um que esteja em seu caminho sem nem mesmo um em segundo pensamento, mesmo que seria mais útil a sua busca você fazer algumas perguntas como "quem é você?" e "onde estou?" e "você viu o Santo Graal em algum lugar?"
Enfim, Cavaleiros da Rodada é o seu bom e velho beat'm up de sempre com a maior parte de sua oposição sendo composta de soldados inimigos quase indefesos, jovens infelizes com jaquetas horrorosas e problemas de corcunda precoce.
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Entre as fases essas duas moças mostram o caminho que você vai percorrer e uma delas parece muito desapontada com o seu trabalho... ou com os próprios peitos. |
Isso tudo parece muito simples, certo? Bem, porque é mesmo. KotR é o template básico de um beat'm up da Capcom onde tudo funciona como deveria funcionar - hit detection, velocidade, dificuldade - mas sem nada que o faça se destacar em particular.
Verdade seja dita, o jogo tenta fazer algumas coisas diferentes, mas honestamente o que ele tenta fazer é basicamente uma versão do homem pobre de King of Dragons. Isso porque se naquele jogo o grande diferencial é o sistema de classes. As classes de KoD não apenas funcionam para dar abordagensde combate diferentes, como elas evoluem e modificando seu dano, resistencia e alcance.
Nesse jogo, temos uma versão aguada disso. A cada tantos pontos seu personagem até "evolui" como no outro, mas é tudo puramente estético realmente. Não que seja ruim realmente, as mudanças de visual são maneiras (especialmente a armadura do Arthur), mas quando você compara como seu jogo "irmão" lançado pela Capcom no mesmo mês, não tem como parecer apenas uma versão pálida dele.
Alem do "level up visual", esse jogo tem uma outra característica única bastante... estranha. Isso porque esse jogo tem um sistema de defender ataques, mas não apenas um botão extra para defender porque no arcade cada botão a mais que você coloca na máquina é um custo a mais. Então a defesa aqui funciona de forma única: no instante que você for atacado aperte para trás e ataque e seu personagem bloqueia o dano.
Como você pode imaginar, isso é absolutamente inviavel em um jogo de luta em que você está sendo atacado por todos os lados o tempo todo. Não imagino que alguém alguma vez tenha usado isso, porque é absolutamente contramão um negócio deses - o resultado mais provavel será você acabar se virando e atacando atrás de você a cada cinco segundos como um idiota tentando golpear uma abelha imaginária em vez de executar um bloqueio. Curiosamente, a ideia não foi descartada de todo e alguns anos mais tarde a Capcom usou esse comando de bloqueio em Street Fighter 3 - e em um jogo de luta 1x1 funciona muito melhor realmente.
Os inimigos do jogo são basicamente camponeses indefesos e provavelmente menores de idade, como eu citei anteriormente, mas as vezes o jogo sai do seu caminho para criar novos inimigos que muito provavelmente não estão representados nos contos de cavalaria. Ao menos eu acho que não, mas se tiver tigres que são inexplicavelmente inflamaveis ao serem derrotados, eu realmente vou querer saber dessa história.
Eu até consigo imaginar a reunião em que a Capcom teve o brainstorm de ideias para esse jogo, aí um executivo doido da cocaína chega chutando a porta, olha rapidamente alguns desenhos e diz: "Gosto do que você fez com esses tigres inimigos, mas está faltando alguma coisa. Qual é sua razão de ser, onde está sua motivação? O que poderia ser? Vamos dizer que eles são tigres loucos! Adorei! Vamos continuar com isso. Só mais uma coisa a respeito do tigre: quero ter certeza de que todos saibam que são tigres machos, então vá em frente e desenhe um grande par de bolas felpudas neles, ok? Obrigado. "
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Infelizmente, não há ninguém listado nos créditos do jogo como "Artista da gônada do tigre", então não posso dizer quem é o responsável por isso. |
Outros inimigos pouco cavalheirescos concebidos pela Capcom envolvem um... ninja que usa jutsu do clone das sombras...
... e o chefe do estágio seis é um guerreiro samurai chamado Blood Armor Muramasa. Eu sei que essa fase é chamada de "Cavaleiros em uma Terra Estranha", mas Arthur realmente viajou até o Japão em busca do Santo Graal? Ou existe um samurai solitário vagando pelos campos de trigo do sul da Inglaterra?
O que eu posso deduzir é que a Capcom se baseou na versão manga das Brumas de Avalon...
Bem, eventualmente nossos heróis chegam a Garibaldi, o vil vilão que pegou o Cálice Sagrado - assim esperamos, a esse ponto é o quarto castelo que é saqueado pela gangue de Arthur em custa do Yadalbabao. Essa luta é particularmente dificil porque se você não tiver dominado o bloqueio quando chegar a esta luta, você vai perder fichas rapidamente e com frequência, porque Garibaldi tem uma grande variedade de ataques a distancia poderosos, a capacidade de interromper seus ataques aparentemente à vontade e uma grande maça vermelha para quebrar crânios.
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Conforme "sobe de nível", Percíval vai ganhando armadura e perdendo cabelo |
Esta é uma luta longa e a única parte do KotR da qual eu realmente não gostei. Mesmo assim, ele ainda tem alguns toques legais - por exemplo, quando Garibaldi desmonta, ele tira seu elmo dourado e o joga de lado, permitindo que você o pegue para ganhar pontos extras e adicionando saque no meio da batalha à lista de crimes de Arthur.
Depois de uma batalha extenuante cheia de bloqueios oportunos e incontáveis ataques de projéteis que farão você gritar "merda de cavalo!" na tela, Garibaldi está morto e seu sonho de uma Itália unificada não será realizado.
Ei, olha só: ele tinha o Santo Graal! Bem, isso é útil, nossos heróis estam ficando sem castelos para invadir. De volta ao esconderijo da floresta de Merlin, os cavaleiros se reúnem para decidir o que deve ser feito com o poder do Graal. Na verdade, existem alguns diálogos diferentes que você pode obter aqui, dependendo de quem desfere o golpe mortal em Garibaldi e quanto tempo você espera para pressionar o botão "pegar o Graal" - se você hesitar, Merlin enche Arthur até que ele aceite relutantemente o Graal com uma atitude "ugh, tudo bem, suponho que serei rei".
Todos prometem usar o poder do Graal para espalhar a paz por todo o país, embora os detalhes disso tenham ficado um pouco nebulosos. Considerando a história da Inglaterra e sua relação com suas colonias, eu não acho que isso tenha funcionado muito bem realmente...
Bem, e esse foi KotR - a chance de ver algo como os mitos românticos da cavalaria europeia através do prisma japonês em um fliperama onde o rei Arthur tem dezessete anos, tem uma barba como a de um homem da montanha e usa a lendária lâmina Excalibur para espancar tigres inflamaveis e samurais.
Knights of the Round não é o melhor beat-em-up side-scrolling de todos os tempos. Diabos, nem mesmo é o melhor da Capcom naquele ano, mas ainda sim é um jogo do genero perfeitamente funcional e as vezes isso é suficiente. Especialmente se você acabou de jogar uma aberração do homem contra Deus como é
LEGEND.
A coisa mais realmente notável que eu posso comentar sobre o gameplay desse jogo, além de samurais e tigres boludos, é que ao invés de frangões no barril de metal para recuperar energia, temos saladas dentro de paliçadas de madeira. Saladas muito bonitas e saudáveis, que aparentemente é uma coisa do Rei Arthur afinal... eu acho?
Agora porque a versão de Super Nintendo tirou o ovo/laranja da salada que tinha no arcade permanece como um dos maiores mistérios da história dos videogames até esta data.
MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
Edição 060
MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 003