25 de dezembro. Manhã de Natal. Em todo o mundo, famílias acordam juntas, celebrando o amor e a união nesse momento mágico. Em algum lugar, uma criança de sprte abre os olhos e encontra um videogame da Nintendo novinho em folha sob a árvore — uma tradição estranhamente reconfortante que não mudou muito nos últimos quarenta anos. É um tempo de alegria. De aconchego. De memórias sendo formadas.
…E aí tem eu. Sentado sozinho em um quarto escuro, jogando uma das franquias de videogame que mais profundamente desprezo em todo o multiverso. Sim. Ele voltou. Meu nemesis. Meu dementador pessoal, que existe apenas para sugar a alegria e garantir que eu jamais sereis feliz novamente. MYST voltou. Porque é claro que voltou. Esta, aparentemente, é o meu Feliz fodendo Natal.
Mas então... uma coisa estranha aconteceu. Enquanto lia sobre o jogo para me preparar mentalmente — como um soldado lendo o briefing antes de uma missão sem retorno — esbarro em uma revelação inesperada: os fãs hardcore de Myst detestam o design dos puzzles nesta sequência. Odeiam. Ativamente.
Espera. Calma. Se os devotos dessa abominação de franquia acham que algo deu errado aqui… então isso significa — ouso dizer — esperança? Será que é isso? Será que este é o jogo de MYST que, mesmo por acidente, acaba sendo tolerável? Um milagre de Natal deixado sob a minha árvore?
Antes de continuarmos, porém, precisamos recapitular o que a franquia Myst realmente é. Já tratei do fenômeno cultural do MYST original — como cativou não-jogadores, e por quê — e de como sua sequência, RIVEN: The Sequel to Myst, dobrou a aposta na fórmula. Mas para todos ficarmos na mesma página, a filosofia central de design da série pode ser resumida de forma bem simples: em vez de criar um mundo 3D real para você navegar livremente, Myst costura uma sequência de imagens estáticas que apenas fingem ser um espaço continuo.
Você não caminha por uma casa 3D. Você clica na imagem de uma porta da frente. Clica e — bam — agora você está olhando para uma imagem do jardim frontal. Clica de novo e está encarando uma calçada. É menos exploração e mais um slideshow extremamente sofisticado. Por que foi feito assim? Porque em 1993, os computadores mal conseguiam renderizar um ambiente 3D simples, quanto mais um bonito. Mas imagens estáticas? Ah, essas podiam ser lindas. Tão detalhadas e atmosféricas quanto os artistas quisessem. Na época, essa "apresentação interativa de PowerPoint" era genuinamente chocante. Myst parecia incrível comparado com o 3D quadrado e feio da época (só ver ALONE IN THE DARK). Na época em que RIVEN: The Sequel to Myst surgiu, em 1997, o impacto foi muito menor. O 3D pré-renderizado já era comum, e o truque já óbvio. Todo mundo sabia como a salsicha era feita, e a ilusão de profundidade de Myst havia perdido grande parte de seu misticismo.
Myst III segue esse mesmo design base, mas o atualiza com imagens de 360 graus, animações em camadas e uso pesado de FMV. Pense em GIFs animados — bem, o equivalente do final dos anos 90 — costurados em cenários panorâmicos. Pelos padrões Myst, isso é extremamente moderno. E para o crédito do jogo, a integração de FMV é notavelmente mais suave aqui. Parece menos com "ator mal pago colado constrangedoramente em uma tela verde" e mais com uma tentativa real de coesão visual. Ainda é inconfundivelmente Myst, mas pela primeira vez, é um Myst que pelo menos sabe em que ano está.
Mas vamos ser claros: Myst III ainda é Myst. E Myst, para seu crédito, nunca é feio. O que Myst é, porém, é uma experiência miserável de quebra-cabeças. E estou usando a palavra "quebra-cabeça" de forma bem livre aqui, da mesma forma que se poderia descrever estar perdido na floresta sem mapa como um "desafio de trilha". Sua interação média em Myst é assim: você encontra uma alavanca. Você puxa. Nada acontece. Você gira uma roda próxima. Ainda nada. O jogo não dá nenhum feedback, nenhuma reação, nenhum reconhecimento de que você sequer existe. O que você deveria ter feito — obviamente — é girar aquela roda no sentido anti-horário um número preciso de vezes igual ao número de árvores na ilha, depois puxar a alavanca exatamente o mesmo número de vezes que há estrelas visíveis no céu naquele momento específico.
E como você deveria inferir isso? Simples. A "dica" está enterrada dentro de um único parágrafo de um livro de cinquenta páginas dentro do jogo. Um de dezenas. Todos escritos com caligrafia a mão em uma resolução que faz a leitura parecer decifrar um manuscrito antigo através de um aquário sujo. Perdeu aquele parágrafo? Que pena. Aproveite mais uma hora de cliques sem rumo, seu idiota.
Se isso soa como se eu estivesse inventando o cenário de quebra-cabeça mais absurdamente complicado que minha mente poderia conceber, tenha certeza: não estou. A Cyan Worlds chegou primeiro. É exatamente assim que os quebra-cabeças de Myst funcionam. Eles são tão agressivamente obtusos que você genuinamente começa a se perguntar se a coisa toda é uma paródia do design ruim de jogos de point'n click. Mas não. Essa é a parte deprimente. Eles não estavam brincando. Isso é sério. Isso é sincero. Isso é desespero, meticulosamente renderizado em fundos pré-renderizados. E agora você entende por que eu odeio a franquia Myst com a fúria de mil sóis amarelos.
Mas então — milagrosamente — algo maravilhoso aconteceu.
O novo milênio chegou. O bug do milênio não nos exterminou como prometido, mas algo quase tão bom quanto aconteceu: os irmãos Miller — Rand e Robyn Miller, os criadores da série — não se deram ao trabalho de fazer um terceiro jogo de Myst. Robyn deixou a Cyan Worlds para seguir outros interesses, e a Cyan mudou seu foco para um novo e ambicioso projeto online chamado Uru. Myst III foi terceirizado completamente para outro estúdio: Presto Studios, com os Millers reduzidos a funções de consultoria.
E é aqui que o milagre acontece.
Porque a Presto Studios, ao contrário da Cyan, aparentemente possuía uma quantidade mínima de orgulho profissional como designers de jogos. Em algum momento, alguém lá deve ter olhado para o projeto de Myst e dito: "Ah, não. Não, nós absolutamente não vamos fazer isso!". Se a Cyan queria adicionar mais um capítulo ao livro de horrores na história do game design ruim, problema deles. A Presto, no entanto, não tinha interesse em participar da piada.
Então eles fizeram algo radical. Algo impensável.
Eles projetaram puzzles como seres humanos normais.
E esta é a melhor coisa que poderia ter acontecido com Myst.
Mas antes de entrarmos nos puzzles, um pouco de contexto: o universo Myst opera na seguinte lógica de que há uma família de seres divinos que escrevem livros. Esses livros são chamados de "Ages" (Eras), por razões nunca totalmente justificadas, e cada um é um mundo real, totalmente formado, que você pode entrar fisicamente. Pense em THE PAGEMASTER — sim, aquele Pagemaster, e não, não espero que ninguém além de mim se lembre que isso existiu — mas levado completamente a sério. Naturalmente, esta família — liderada por Atrus — tem níveis de disfunção doméstica dignos da mitologia grega. Traições, rancores, lutas de poder, irmãos fazendo coisas indizíveis com a própria realidade. É daí que vêm todas as aventuras de Myst: problemas não resolvidos de uma família imortal, eternamente terceirizados para algum estranho aleatório com um mouse e muita paciência.
Em Myst III, a premissa é surpreendentemente direta. O personagem de Brad Dourif — sim, aquele Brad Dourif, nosso amado Chucky Brinquedo Assassino, ou o Língua-de-Cobra, se preferir — rouba o livro mais recente de Atrus. Você está por perto, então parabéns: agora você está envolvido.
Por que você, especificamente? Bom, em parte porque Atrus é um babaca preguiçoso. Mas principalmente porque a última vez que ele entrou pessoalmente em uma de suas preciosas Eras, ficou preso lá por trinta e três anos. O que, suponho, conta como uma experiência de aprendizado. Então, em vez de arriscar de novo, ele subcontrata o trabalho para você. Não porque você é especial, treinado ou qualificado — mas porque caso contrário não teriamos um jogo.
Então você persegue o ladrão por várias Eras — cada uma leva uma era para ser terminada, naturalmente — enquanto ele deixa quebra-cabeças para trás para te atrasar. Porque aparentemente esse é o poder concedido por controlar uma Era. Não a divindade. Não a onipotência. A capacidade de forçar estranhos a resolver quebra-cabeças de lógica antes de poderem passar.
É basicamente o Um Anel, mas em vez de invisibilidade e fazer os Nazgûl saberem onde você está, você ganha o poder de exigir que as pessoas contem símbolos, rotacionem mecanismos e fiquem encarando pistas ambientais até o cérebro derreter. Não me pergunte como isso funciona. A resposta está enterrada em algum lugar nos livros do jogo, e eu valorizo o que restou da minha visão para decifrar aquela caligrafia amaldiçoada e perder quatro pontos de dioptria no processo.
O que eu sei é isto: Myst III parece muito menos com o Myst clássico e muito mais com Professor Layton. E deixe-me dizer — isso não é nada menos que uma bênção. Claro, os quebra-cabeças aqui muitas vezes parecem arbitrários ou artificiais — e em quase qualquer outro contexto, isso seria um problema sério. Mas pelos padrões Myst? Isso é ouro absoluto. Em vez de um nonsense metafísico disfarçado de teste de intelecto, o jogo geralmente pede que você se envolva em algo que se assemelha a lógica de verdade.
A maioria dos quebra-cabeças gira em torno de reconhecimento de padrões ou da manipulação de máquinas elaboradas, muitas vezes excessivas, no estilo Rube Goldberg. Às vezes essas máquinas nem são máquinas, mas plantas bio-mecânicas estranhas que funcionam como tal, porque Myst nunca pode ser normal. Você pode precisar girar uma série de espelhos para focar a luz do sol em uma porta selada, ou descobrir como religar os circuitos para ativar um gerador de energia dormente. Estes são problemas tangíveis com causa e efeito visíveis — um conceito alienígena para esta franquia.
Os quebra-cabeças ainda são desafiadores, e vão absolutamente testar suas habilidades de observação e sua capacidade de conectar pistas visuais díspares. Ou, se isso falhar, sua tolerância à tentativa e erro. Mas mesmo assim, esta é uma melhoria massiva em relação à borderline paródia que o design de quebra-cabeças do Myst costumava ser.
Dito isso, até essa abordagem mais humana introduz alguns problemas estruturais. Você muitas vezes encontra vários quebra-cabeças disponíveis ao mesmo tempo, com pouca indicação de quais alavancas, rodas ou mecanismos estão conectados a qual resultado. Isso pode levar a uma sensação de falta de rumo, onde você não está resolvendo quebra-cabeças, mas sim fazendo malabarismo com os inacabados em sua cabeça. E quando você realmente empaca, há muito pouco que o jogo permite fazer além de vagar pelas mesmas áreas repetidamente, refazendo passos que você já memorizou, na esperança de ter perdido algo — qualquer coisa — na primeira dúzia de vezes.
No final das contas, Myst III sobrevive ou morre dependendo de quanto você gosta de resolver quebra-cabeças, porque, como seus predecessores, os quebra-cabeças são os únicos guardiões do progresso. Mas a diferença crucial é esta: você geralmente consegue entender o que o jogo está pedindo de você. Isso sozinho representa uma mudança atomica para a série.
Além disso, a história é surpreendentemente satisfatória. A atuação de Brad Dourif é genuinamente boa, adicionando uma camada bem-vinda de ameaça e personalidade, e é profundamente catártico finalmente ver a família Atrus ser tratada menos como sábios benevolentes e mais como os seres divinos e canalhas que eles claramente são.
Myst III é um jogo de quebra-cabeças que vai explodir sua mente? Não. Absolutamente não.
Mas é um jogo de quebra-cabeças que espera que você o compreenda. E essa única escolha de design faz de Myst III a melhor entrada da série por uma larga margem.
Não que a concorrência seja particularmente difícil.



.webp)
.webp)
.webp)
.webp)
.webp)
.webp)



