domingo, 28 de dezembro de 2025

[#1632][Nov/2000] TOMB RAIDER: Chronicles

Oh boy, chegou a hora de fazer as crônicas das Crônicas. O quinto — e último — dos jogos originais de Tomb Raider da era PlayStation. Ao longo dos anos, Tomb Raider Chronicles foi consistentemente chamado de o pior dessa leva. A ovelha negra. Aquele que todo mundo finge que não existe ao relembrar os dias de glória da nossa querida Laurinha. Mas essa reputação é realmente merecida?

…Sim. Ela é.

Não vou enrolar e não vou encher linguiça: Tomb Raider 5 é o pior jogo de Tomb Raider no PS1, e por uma boa margem. Nisso, pelo menos, a internet está absolutamente certa. Mas — e é aqui que as coisas ficam um pouco mais interessantes — ele é realmente um jogo ruim no geral? Seria esse jogo um lixo catastroficamente quebrado e injogável ou pelo menos genuinamente ruim num sentido mais amplo?

Essa resposta, no entanto, não é tão simples, então vamos dar uma olhada mais de perto no que exatamente deu errado com a nossa pior arqueóloga favorita de todos os tempos.

Core Design, CIRCA 2000

Antes de irmos mais a fundo, porém, precisamos de um contexto. Tomb Raider 5 é o quinto jogo de Tomb Raider. Sim, eu sou um prodígio da matemática. Mas isso quer dizer também que é o quinto jogo lançado em apenas cinco anos. Desde 1996, a Core Design vinha vomitando lançamentos anuais de Tomb Raider para seus overlords da Eidos todo fim de ano com a precisão de um relógio suíço. E suponho que não precisa ser um genio do game design para imaginar que cinco jogos em cinco anos deixa muito pouco espaço para revitalizar muito as coisas, especialmente quando se trabalha com a mesma engine, a mesma mecânica e prazos cada vez mais curtos.

Na época em que TOMB RAIDER: The Last Revelation foi lançado, a Core Design já estava claramente exausta. Esgotada. Cansada das acrobacias da Lara, cansada das tumbas, cansada de empurrar a mesma pedra morro acima ano após ano. E assim, num raro momento de compromisso narrativo, eles decidiram acabar com tudo. TOMB RAIDER: The Last Revelation deveria ser exatamente isso: Lara Croft morre, enterrada viva em uma tumba desabando, encontrando seu fim dramático enquanto fazia o que mais amava — saquear ruínas antigas e ignorar normas básicas de segurança. Foi um movimento ousado. Um final definitivo. Algo que deu a uma das personagens femininas mais icônicos de todos os tempos um senso de encerramento.

E foi algo que a Eidos olhou e disse: "Hahaha… não."

De jeito nenhum eles deixariam sua galinha dos ovos de ouro permanecer morta. Não para sempre. Nem por um ano. Acionistas não entende luto, eles entendem monetização. Então, em 2000, outro Tomb Raider sairia — quer a Lara estivesse viva, morta, ou estivesse temporariamente indisponível para a continuidade. E Chronicles é o que acontece quando um jogo existe não porque alguém queria fazer, mas porque alguém tinha que fazer.

Agora, quando digo que a Core Design estava cansada de fazer jogos de Tomb Raider, essa não é uma uma interpretação pessoal ou eu lendo entrelinhas — estou literalmente citando os próprios desenvolvedores. Em uma entrevista à Eurogamer, Andy Sandham — designer de fases e artista da Core Design na época, e alguém que trabalhava com a Lara desde TOMB RAIDER 2 Starring Lara Croft  — disse o seguinte:

"Tomb Raider 4 foi o que nos deixou mais orgulhosos, mas já estava decaindo. Tomb Raider 5 era efetivamente um monte de merda velha. Aquele foi o mais deprimente para nós. Nós basicamente só estávamos fazendo aquilo pelo salário porque nenhuma outra equipe queria assumir. Então nós tivemos que fazer, basicamente. Naquela altura, já tinha cobrado seu preço. Três anos dando duro, e estávamos esgotados. Isso transparece no produto."

Bem… catapimbas. Dessa vez eu tenho que concordar com o AVGN, esse é um raro caso em que os desenvolvedores fizeram a review por mim. Não tem nada para especular aqui. Nenhuma intenção oculta. Nenhuma visão mal interpretada. As pessoas que fizeram o jogo admitem abertamente que odiaram trabalhar nele — e pior, sabiam que isso transparecia.

Porque, como eu disse, a Core estava cansada. O público também estava cansado — algo que os números de vendas desse jogo deixaram dolorosamente claro. A única parte que não estava cansada de mais Tomb Raider era a Eidos. Mais Lara, mais pirâmides, mais polígonos, mais dinheiro. Isso porque àquele ponto, Tomb Raider não era apenas uma franquia; era sua espinha dorsal financeira.

Na verdade, a Eidos queria tanto Tomb Raider que tinha dois jogos em desenvolvimento simultaneamente. Enquanto uma equipe exausta da Core se arrastava para fazer Chronicles por obrigação contratual, outra equipe — possivelmente na sala ao lado — estava sendo violentamente espancada pela Emotion Engine do PS2, tentando forçar a franquia a entrar na próxima geração na base do ódio. Isso, é claro, acabaria nos dando The Angel of Darkness… mas essse desastre rodando a 8 FPS em particular terá sua própria autópsia em outra oportunidade.

Por enquanto, vamos manter o foco. Sabemos que Chronicles é ruim. Sabemos que a Core Design odiava abertamente fazê-lo. Sabemos que a franquia estava criativamente falida nesse ponto. Mas a verdadeira pergunta ainda permanece: Sim, é ruim — mas é realmente tão ruim quanto sua reputação sugere?

Olha, deixa eu começar dizendo o seguinte: na verdade, eu não odeio a ideia de Tomb Raider Chronicles. Não, sério — estou falando bem sério. No papel, não é um conceito ruim. Após a suposta morte de Lara no final de TOMB RAIDER: The Last Revelation, um punhado de seus amigos se reúne para um funeral simbólico. Eles se sentam em volta de uma lareira, trocando histórias sobre a maior dama que já viveu, e as fases do jogo são recordações dramatizadas de suas aventuras passadas. Estruturalmente, é uma antologia — cada episódio uma história autônoma, filtrada pela memória, exagero e mito. E, sinceramente, eu gosto disso.

Na verdade, eu diria que cada um dos quatro episódios é claramente feito para funcionar como uma peça complementar a um dos quatro jogos anteriores. O episódio de Roma é uma óbvia homenagem às fases de Veneza de TOMB RAIDER 2 Starring Lara Croft , completo com o retorno de Pierre e Larson, mesmo que não faça sentido cronológico, mas enfim. O episódio da Rússia coloca Lara contra gângsteres enquanto caça um tesouro escondido no fundo do mar — um eco direto de suas batalhas com os capangas de Bartoli e a exploração do Maria Doria também em TOMB RAIDER 2 Starring Lara Croft .

O episódio da Irlanda nos leva ainda mais para trás, nos deixando jogar com uma Lara adolescente, um conceito introduzido pela primeira vez em TOMB RAIDER: The Last Revelation. E depois tem o episódio da VCI, que parece uma remix das fases de Nevada de TOMB RAIDER 3: Adventures do Lara Croft: jogabilidade mais furtiva, cenários industriais, equipamento militar — e sim, Lara está de volta com o catsuit, porque é claro que está.


Então, pelo menos em um nível conceitual, eu genuinamente acredito que a Core Design conseguiu espremer algum suco deste limão. É um recurso de enquadramento inteligente, uma volta olímpica nostálgica pela identidade da Lara na era PS1, e uma forma de reciclar ideias familiares de uma forma que soe mais como homenagem do que desespero.

Olha só. Chronicles te convence de que tinha uma razão para existir... até você realmente jogar as malditas fases. Pois é. A Core Design realmente não estava brincando quando disse que estava de saco cheio de Tomb Raider. Porque, nossa, isso transparece e muito.

Pegue o episódio de Roma, por exemplo. Na superfície, parece o clássico Tomb Raider old-school — corredores de pedra, interruptores, tiroteios — mas também parece agressivamente padrão. Sem graça. Recheado de momentos que gritam "Não me importo, tanto faz, manda qualquer merda". O exemplo perfeito é quando você está explorando o Coliseu e de repente é atacado por um gladiador romano acompanhado por um leão. Opa, opa — espera aí. Como exatamente isso deveria funcionar?

Pelo menos no Remaster feito em 2025 você pode usar roupinhas novas na Laura, yay

Esta história supostamente se passa nos anos 90. Então como é que tem um gladiador romano todo paramentado vagando casualmente pelo Coliseu com seu leão de estimação? Essa não é uma tumba subterrânea esquecida no meio do nada — é uma das atrações turísticas mais famosas do planeta. Qual é a implicação aqui? Que o clã desse cara mora de favor no Coliseu com sua alcateia de leões há uns 1.500 anos? Ou ele é apenas um ator de reconstituição histórica que odeia britânicas metidas? Claro, a resposta real é muito simples: a Core não se importava mais. Roma, gladiador, leão — só joga aí. Tanto faz.

E isso não é eu sendo detalhista com a escolha de inimigos de forma isolada. Essa mesma energia de "tanto faz" infecta todo o design de fases. Os espaços são desinteressantes, sem inspiração e visualmente sem graça. Tecnicamente parecem Tomb Raider — o movimento, os pulos, o tiroteio ainda estão lá — mas tudo está funcionando no piloto automático. Você praticamente sente os designers seguindo uma checklist em vez de uma ideia. Agora, não me entenda mal: o jogo ainda é jogável. Funcional. A Lara se move, quebra-cabeças existem, inimigos atiram de volta. Mas isso é o mais generoso que posso ser. Ele funciona, e esse é o fim do elogio.

O que realmente me incomoda, porém, é que nenhum dos set pieces do jogo parece lugares onde você realmente gostaria de conhecer. Para mim, o principal atrativo de Tomb Raider sempre foi a sensação de maravilha — a emoção de ver locais extraordinários transformados em espaços exploráveis. Um mosteiro tibetano. Ruínas incas no Peru. O Vale Perdido com fodendos dinossauros. Até as lendas urbanas envolvendo a Área 51 no deserto de Nevada. Aqueles não eram apenas fases; eram cenários para preencher sua imaginação.


Tomb Raider Chronicles não tem nada disso. Sua escolha de cenário é… cenário. Roma parece uma fase de cidade genérica. O segmento russo é, bem, um navio. A Irlanda parece uma cópia barata de SHADOW MAN. E eu não tenho certeza absoluta do que as fases da VCI deveriam ser, conceitualmente.

Se o nome Tomb Raider não estivesse impresso na caixa, você poderia facilmente confundir essas fases com fases filler em SYPHON FILTER ou algum outro jogo de plataforma 3D genérico do final dos anos 90. E isso — mais do que bugs, mais do que repetição, mais do que fadiga da franquia — é o que realmente torna Chronicles triste.

Outra ilustração perfeita dessa apatia no design é a fase final do jogo, "Red Alert!" na Von Croy Industries. Nesse ponto, ela não é apenas a fase mais fraca de Chronicles — é indiscutivelmente a pior fase de toda a franquia até este ponto. E não quero dizer "ruim" de um jeito subjetivo, do tipo "eu não gostei". Quero dizer praticamente injogável sem um guia.

Esta fase constantemente pede ao jogador para fazer coisas que nenhum jogo de Tomb Raider antes dela jamais o treinou a fazer. Em um ponto, espera-se que você interaja com uma parede completamente comum, sem nenhuma pista visual ou lógica aparente — um momento digno de Castlevania II: Simon's Quest, sem a desculpa de ter sido feito em 1987. Aperte Ação na parede. Por quê? Porque sim.

Depois tem os robôs. Meu Deus, os robôs. De repente, o jogo introduz uma mecânica completamente única, nunca devidamente explicada, para lidar com inimigos robóticos — claro, bem no final do jogo, quando ensinar novos sistemas é exatamente o que você não deveria estar fazendo. Você deve desativá-los temporariamente atirando pra caralho, pegar um código e então — de alguma forma — descobrir que o próximo passo envolve fazer uma speedrun para prender o robô em uma área selada. Para que você possa matar ele com gás. POR QUE VOCÊ MATA UM ROBÔ COM GAS, DE TODAS AS COISAS?!?

Não tem lógica no universo, nenhuma consistência mecânica e nenhuma linguagem de jogo que sugira isso. Nada indica que robôs são vulneráveis a gás. Nada te diz que você está com tempo limitado. Nada comunica que falhar em correr nessa sequência significa que você travou seu progresso e precisa recarregar um save anterior. Isso não é design de puzzle. Isso é sadismo de tentativa e erro disfarçado de "desafio". Parece menos com resolver um mecanismo antigo e mais com adivinhar o processo de pensamento do designer depois que ele parou de se importar.


E isso, mais do que qualquer outra coisa, encapsula perfeitamente Tomb Raider Chronicles. Não está apenas cansado — está confuso, pouco comunicativo e fundamentalmente desinteressado em respeitar o tempo do jogador. Quando seu grande final requer uma FAQ aberta em um segundo monitor só para permanecer funcional, algo deu muito, muito errado.

Mas apesar de todas as suas falhas, Tomb Raider V é, como eu disse, pelo menos é jogável. Isso pode soar como um elogio fraco — e absolutamente é — mas importa. Além de de voltar a uma estrutura de fases mais linear, Tomb Raider Chronicles também mantém os cenários mais compactos de The Last Revelation, o que torna o backtracking menos maçante se você perder um item ou ativar um gatilho. Só isso já o coloca acima de jogos verdadeiramente quebrados.

Eles também reduziram sensivelmente o número de tiroteios — que sempre foi um dos elementos mais fracos da série — e, para seu crédito, eles ao menos tentam algumas sequências de jogabilidade com truques que a engine envelhecida claramente não foi projetada para suportar. A exploração e a resolução de quebra-cabeças permanecem satisfatórias porque, bem… ainda é Tomb Raider. Aquele ciclo fundamental de observação, travessia e resolução de problemas ambientais ainda funciona.


Onde as coisas começam a desmoronar é nas seções de stealth e combate desarmado. Elas frequentemente parecem menos uma evolução da fórmula e mais uma aventura de point-and-click desajeitada enxertada em controles de tanque. O progresso é frequentemente bloqueado por itens muito específicos usados para desativar inimigos desprevenidos, espantar fantasmas ou contornar sistemas de segurança. Até você encontrar a solução correta, o jogo simplesmente se recusa a deixá-lo avançar. Não é que eu não entenda — ou mesmo aprecie — por que a Core queria algo diferente com a fórmula. Mas esses momentos apenas reforçam o ponto: os desenvolvedores claramente queriam estar fazendo qualquer coisa, menos outro jogo de Tomb Raider.

Então sim, não é tão ruim assim. Exceto quando absolutamente é.

E nada disso deveria ser uma surpresa, porque a jogabilidade central de Tomb Raider 5 é quase idêntica à de Tomb Raider 4. Que por sua vez era notavelmente similar a Tomb Raider 3. Que foi apenas um refinamento modesto de Tomb Raider 2. E enquanto 2 foi um claro avanço em relação ao original, a base desses jogos permaneceu fundamentalmente inalterada durante toda a permanência da Lara no PS1.

Escalar. Pular. Explorar. Atirar na cara das pessoas. Recuperar artefatos que você não tem nenhum direito moral de possuir, mas pega mesmo assim porque Lara Croft é a maior britânica que já viveu, e roubar artefatos de suas culturas nativas é basicamente a pedra angular da cultura anglo-saxonica. Mas divago.


O ponto é este: antes de jogar o jogo para esta review, eu nunca tinha tocado em Tomb Raider Chronicles. Eu só conhecia sua reputação — as coisas que falam mal, as piadas, a decepção. Agora que realmente joguei, estou mais impressionado é que alguém se lembre dele bem o suficiente para criticá-lo. A experiência toda é tão curta, tão esquecível e tão completamente sem significado dentro do escopo mais amplo da linha do tempo da Lara que mal se registra.

A história, apesar do seu conceito legal, vai de nada a lugar nenhum. Os upgrades visuais são inexistentes. As melhorias na jogabilidade são tambem inexistentes ou ativamente frustrantes. Nada aqui parece uma culminação, nem mesmo um adeus adequado. Então a grande pergunta a ser feita é essa: Lara Croft saiu com estrondo ou com um suspiro no final de sua era PS1?

Depois de jogar Chronicles, posso dizer com confiança que não foi um estrondo. Mas também nem foi um suspiro. Um suspiro implica que houve algum tipo de reação para começo de conversa. Tomb Raider V é inerte. O gás nobre dos videogames.

A boa notícia é que o próximo jogo de Tomb Raider chegaria apenas três anos depois — The Angel of Darkness, lançado em 2003 — em um hardware muito mais poderoso. Com mais tempo, mais recursos e um novo começo, certamente eles não vão estragar tudo dessa vez.

…né?

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