sexta-feira, 25 de abril de 2025

[#1459][Nov/1999] ROCKET: Robot on Wheels


Hoje, a Sucker Punch não é apenas uma desenvolvedora conhecida, mas também bastante respeitada no mundo dos videogames – afinal, Ghost of Tsushima, indicado a Jogo do Ano em 2020 e vencedor do prêmio de Melhor Direção de Arte, é uma verdadeira aula sobre como criar um mundo aberto memorável. Mas em 1999, as coisas eram um pouco diferentes: recem formada por ex-funcionários da Microsoft, os fundadores da Sucker Punch estavam muito mais preocupados em pagar a conta de luz do que em produzir grandes obras de arte.

O que nos leva então ao primeirissimo (e que absolutamente ninguem lembra) jogo do estúdio que depois viria a criar obras bem mais memoráveis como inFAMOUS e Sly Cooper!


Então, vamos reservar um tempinho para falar de Rocket: Robot on Wheels, um título que transita entre “joia escondida” e “esquecido com razão”. Lançado em 1999 para o Nintendo 64, Rocket é um plataforma 3D que ousou se perguntar: “E se fizéssemos nossa própria versão autoral de Super Mario 64… com um robô mono-roda cuja tração é, no mínimo, questionável?”
 
A trama de Rocket é aquele feijão com arroz dos jogos de plataforma, com uma pitada de desenho animado de sábado de manhã: você é Rocket, um robô de manutenção em um parque de diversões futurista. O chefe está fora, e sua missão é manter tudo funcionando. Mas—plot twist—a mascote do parque, um furão maligno chamado Jojo, resolve iniciar a sua própria rebelião, rouba os planos do parque e ainda sequestra seu mentor. Cabe a você, Rocket, o herói de uma roda só e zero carisma, atravessar sete mundos temáticos e colocar ordem na bagunça. Você sabe, outra terça-feira no trabalho.


Entre todos os jogos 3D que tentaram surfar na onda de Mario 64, Rocket talvez seja o que mais captou o espírito da Nintendo de 1996 — pelo menos no conceito. Em vez de trajetos lineares, as fases funcionam como caixinhas de areia: playgrounds onde cada canto esconde uma engenhoca nova para garantir um coletável. Só que, em vez de cinco estrelas, você garimpa… quinze letras? Fichas? Chips?Eu não posso dizer que tenho absoluta certeza do que elas deveriam ser, mas ei, são brilhantes e fazem os números subirem, então estamos pegando.

E embora a Sucker Punch não seja nenhum Miyamoto, dá para ver o esforço. Cada mini-objetivo traz uma proposta diferente e costuma usar a física ou as mecânicas do cenário de forma criativa. Quer montar uma montanha-russa para alcançar aquela letra no alto? Manda ver. Quer pular num carrinho em forma de cachorro-quente e voar por um aro em chamas? Sem problemas. Rocket está sempre jogando um brinquedo novo na sua direção e desafiando você de maneiras inesperadas — e isso, convenhamos, é louvável.


Só que enquanto o level design faz o seu melhor esforço para ser interessante e sempre te dar algo novo para fazer... a mesma luz otimista não pode ser jogada sobre a jogabilidade e muito por causa do título do jogo. Pra começar que o nome já é uma enganação, "Foguete: Robô sobre Rodas" é uma mentira pq ele anda sobre uma roda só, singular. Mas isso a parte, o real problema é que Rocket não anda. Rocket rola. Em uma roda só. Tipo o sucessor espiritual de Uniracers que ninguem pediu, e que a Sucker Punch por alguma razão achou que era uma ótima ideia fazer cada superfície parecer gelo coberto com óleo.

Foi uma decisão ousada. Ruim, mas ousada. Porque enquanto o jogo quer ser um playground, seu principal método de interação com ele é um robô bamboleante que faz curvas como um carrinho de mão. É meio difícil explicar sem pegar no controle, mas Rocket quase se comporta como um veículo — quase — e também quase se move como um personagem típico de plataforma 3D — quase de novo. O resultado é esse limbo esquisito onde nada responde exatamente como deveria, o que, num jogo que depende de pulos de precisão, é... problemático.

Also, a camera da quinta geração...

O que, como você pode imaginar, não é a melhor escolha do mundo para um jogo que exige saltos de precisão, fazendo com que as plataformas virem menos uma questão de habilidade e mais uma briga com os controles até eles obedecerem por alguns segundos. É jogável, sim—mas nunca chega a ser prazeroso.

E já que estamos nisso, vamos falar sobre o nosso herói em si: Rocket é o equivalente robótico de um pão sem casca. Um monociclo metálico vermelho com dois olhos e toda a personalidade de uma calculadora. O nome do jogo é tão genérico que parece ter saído de um gerador automático de títulos educativos dos anos 90 — Rocket: Robot on Wheels soa menos como um game e mais como um CD-ROM que viria junto com um pacote de cereais. Não é só esquecível — é esquecível com força. Sério, você cria um parque de diversões cheio de engenhocas malucas, brinquedos dimensionais, física criativa... e escolhe como mascote um robô que parece o primo apagado do Clippy? Uau. Que surpresa que ninguém lembra desse jogo, hein?


 
No fim das contas, Rocket é um paradoxo ambulante. É mais inteligente e criativo que a média dos plataformas 3D da época (sim, Starshot, estou olhando pra você com desprezo). Dá pra perceber que foi feito por gente que entendia o gênero e queria empurrar suas fronteiras — algo que a Sucker Punch deixaria claro mais tarde com Sly Cooper e inFAMOUS. Mas por mais espertos que sejam os puzzles, por mais criativas que sejam as fases, o jogo simplesmente não é gostoso de jogar. E, convenhamos, nenhum design de nível, por mais brilhante que seja, salva um jogo de plataforma com movimentação ruim.

Pensamento final? Se for fazer um jogo de plataforma, talvez evite fazer o protagonista controlar como um Segway descendo um tobogã. Só uma ideia. Ah, e outra coisa: não obriguem o jogador a coletar 100% dos itens pra terminar o jogo. Sério, que tipo de decisão foi essa? Isso transforma o que poderia ser uma caça divertida por colecionáveis num estágio final de exaustão mental. Existe uma razão pela qual nenhum outro plataforma exige isso.


Felizmente Donkey Kong 64 não teve essa mesma ideia maldita — ou eu não teria saído vivo da experiência —  mas para ocasiões futuras, tentem não fazer mais isso, okay?


MATÉRIA NA GAMERS
EDIÇÃO 046 (Dezembro de 1999)