quarta-feira, 16 de abril de 2025

[#1450][Nov/1999] MTV MUSIC GENERATOR (ou "Music 2000" na Europa)

 


A review de hoje vai ser um pouco diferente do habitual, isso pq MTV Music Generator é um jogo diferente do habitual. Quer dizer, sequer é um jogo na verdade, ele é um programa de mixagem de som com uma interface ultra amigável para quem não entende nada de música. Pense no editor de música do MARIO PAINT, mas com samples de verdade no lugar de sons engraçadinhos. 

Com efeito, o jogo tem mais de 1.500 riffs pré-gravados e 3.000 sons de instrumentos, além de ferramentas de copiar e colar, reverb, eco e outras traquitanas para fazer um batidão dance-mix trance para fazer músicas que você realmente veria como trilha sonora em um jogo ou na balada mais próxima de você, sério:


Não fosse isso o suficiente, você podia colocar seus próprios CDs de música e copiar pequenos samples (bem pequenos mesmo, não é como se a memória RAM do PS1 desse pra muita coisa) de suas músicas favoritas pra usar no seu batidão nervoso. Essa habilidade revolucionaria somada a uma interface  realmente amigavel mesmo para quem não entende pachongas de música (como eu), permitia montar algo que parece razoavelmente com uma música em poucos minutos. Não, sério²:


Sim, fui eu que fiz essa música aí. Não é algo que se diga "minha nooossa, saíria no CD as Top 10 do Celso Portiolli", mas eu fiz em vinte minutos sem noção musical nenhuma. O editor de clipes, como dá pra ver, é meio chonguinho, mas então esse não é o foco do jogo então vá lá, passa.

Mas então, a ideia de fazer não um jogo mas sim um programa de edição musical que por acaso roda no seu PS1 é algo bem diferente de qualquer outra coisa nesse blog e por isso mesmo vamos fazer uma review diferente. E por "vamos" eu quero dizer literalmente pq a review mesma será escrita baseada em relatos de Kellin Manning, membro da dupla Boomkat - que é altamente prestigiada na cena dance-eletronica, tendo várias trilhas sonoras em séries e filmes como CSI: Miami, Sons of Anarchy, Hawaii Five-0, Orange Is the New Black e 8 Mile.

Então, sem mais delongas:

Na época em que a conexão discada da sua mãe gritava mais alto que o seu amplificador, eu era só uma adolescente encrenqueira com um PlayStation lascado, opiniões demais e nenhuma ideia de como fazer música. Instrumentos? Caros demais. Bandas? Cheias de pose. Estúdios? Sonha, querida. Mas MTV Music Generator? Aquele disquinho de plástico foi o mais perto de um estúdio que eu tive — e, puta merda, como isso mudou tudo.

Lembro da primeira vez que botei o jogo pra rodar. Aquilo me deixava criar uma batida, jogar umas guitarras distorcidas por cima, e sentir que eu tava fazendo barulho que importava. Naqueles tempos, a cena punk era uma salada esquisita. Metade da galera tentava ser mais “edgy” que a outra escrevendo letras sobre como odiava os subúrbios, e a outra metade só queria tocar num porão e não ter o equipamento roubado. Tinha zine, demo em fita, CD gravado em casa com o nome rabiscado em canetinha: "Dog Vomit EP 2001". E no meio de toda essa maravilha caótica, lá estava eu — aprendendo sobre loops, viradas, e estrutura num jogo de PlayStation com MTV na capa.

 

Era espírito DIY puro. Você não precisava de selo [de gravadora], de baterista que mantivesse o tempo ou mesmo de cordas que não estivessem enferrujadas. Só precisava do controle, de uma TV e da vontade de gritar pro vazio em forma de polígonos e formas de onda pixeladas. Eu passava horas empilhando batidas, socando linhas de baixo sujas, fingindo que era uma produtora underground destinada a derrubar o sistema faixa por faixa.

Hoje, vejo que o jogo era limitado pra caramba. Fazer sample de CD era virar sua música favorita numa bagunça de dois segundos. Os visuais? Envelheceram pior que leite no sol. Mas a sensação que ele me dava? Aquela ideia crua e libertadora de que eu podia fazer música sem pedir permissão pra ninguém? Isso não tem preço.

 

O disco ainda tem um modo multiplayer, em que é possível fazer uma jam session juntos


Foi graças a esse jogo que rolou meu primeiro show. Sem zoeira. Toquei uma música minha numa apresentação da escola — gravei num CD, entreguei pro nerd do audiovisual e dei instruções como se fosse a porra do Rick Rubin. A faixa era horrorosa. As transições travadas, o baixo engolindo tudo, e talvez eu tenha roubado um trecho de uma música do Evanescence (me processem). Mas a galera aplaudiu. Alguém perguntou onde eu tinha gravado. Eu disse: “no meu PlayStation.”

Hoje eu tenho uma pedaleira que parece um ritual satânico sci-fi e toco com uma banda que realmente sabe manter o ritmo. Mas MTV Music Generator? Foi minha porta de entrada. A primeira vez que percebi que música não era só pra riquinho com guitarra Gibson ou pros caras de cabelo ensebado com gravador de quatro pistas — era pra quem tivesse raiva suficiente pra fazer barulho.

Então, talvez não seja o melhor software de música já feito. Mas pra aquela garota esquisita e furiosa que eu era? Foi um bote salva-vidas. Uma revolução. Um dedo do meio sonoro pra toda a indústria. E isso, meu bem, é o que há de mais punk.

 

Além de permitir você criar seus próprios samples com um tecladinho virtual para emular notas, a quantidade de efeitos que podem ser aplicadas aos samples já existentes é surpreendentemente vasta

MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 069 (Dezembro de 1999)


MATÉRIA NA GAMERS
EDIÇÃO 049 (Janeiro de 2000 - Semana 3)