terça-feira, 1 de abril de 2025

[#1435][Out/1999] CRASH TEAM RACING


Os anos 90 foram a era de ouro dos Kart Racers. Após o grande sucesso de SUPER MARIO KART, todo mundo e a mãe de todo mundo viu que era bastante simples fazer um jogo do genero: desenhe uma pista, coloque uns bonecos carismáticos (preferencialmente de alguma franquia por quem o público já tem carinho) e pronto. Você não precisa de muito esforço em performance, velocidade ou hit detection, apenas faz uma versão chibi de todo mundo e manda bala.

Isso gerou numa verdadeira enxurrada de títulos do genero e quando eu digo que era todo mundo mesmo, não era brincadeira: POWER RANGERS ZEO, MICKEY SPEEDWAY USA, Speed Punks, MOTOR TOON GRANDPIX e MOTOR TOON GRAN PRIX 2, AYRTON SENNA KART DUEL, AYRTON SENNA KART DUEL 2, Street Racer... entre muitos outros - isso sem citar os clássicos MARIO KART 64 e DIDDY KONG RACING, obviamente.


Então a pergunta que cabe ser feita aqui é: em um genero tão saturado por muitos jogos que não tinham nada realmente a acrescentar... por que Crash Team Racing é lembrado como algo especial? O que realmente o destaca e o coloca em pé de igualdade - se não superior a MARIO KART 64 e DIDDY KONG RACING?

É o que veremos a seguir.


Então, antes de começar a explicar o que esse jogo tem de especial, eu preciso explicar o que é rubberbanding. Funciona assim: em um jogo de corrida, seria muito chato se quem está na frente continuasse na frente e quem está atrás não o alcançasse. O videogame pra ser divertido precisa da alternancia de posições, da confusão, do dedo no kart e gritaria.

Como o jogo resolve isso e garante que as coisas permaneçam interessantes? O jeito mais simples é usar um truque de programação que é chamado de "Rubberbanding": quem está atrás é magicamente propulsionado para a frente como se tivesse um elástico de borracha ligando você na liderança ao segundo colocado controlado pela CPU.

ISSO... NÃO PARECE MUITO JUSTO, SABE?

Parece pq não é de fato, e essa é a razão de Rubberbanding ser visto como uma coisa ruim. E é aqui que entra o brilho do batidão do Crashonildo Nervoso: uma das coisas que faz CTR se destacar é seu uso bem reduzido dessa tecnica (embora as corridas dos chefes ainda usem e abusem disso).


Como CTR faz, então: em vez de usar truques baratos para criar tensão artificialmente, CTR minimizou isso em favor de uma jogabilidade pura e caótica. Em vez de o jogo "trapacear" para manter as corridas acirradas, ele deixou o design dinâmico da pista repleta de riscos ambientais e atalhos e uma quantidade absurdamente generosa de itens de ataque fazerem o trabalho.

Isso significa que a corrida é disputada pq tem tanta bagunça acontecendo na pista, tem tantas variaveis que tanto jogador quanto a CPU cometem erros naturais, críveis a realidade da corrida, criando uma sensação orgânica de desafio sem parecer injusto.


Outro ponto importante é que, embora CTR não tenha inventado o power drifting nos jogos de kart, foi um dos que melhor o implementou. O sistema funciona assim: ao pressionar R1, seu personagem dá um pulo. Se fizer isso durante uma curva, ele entra em drift, ativando uma barra que começa a encher. Quando atinge o ponto certo, apertar L1 concede um pequeno boost e reinicia a barra. Se repetir o processo duas vezes seguidas, na terceira ativação o impulso é ainda mais forte, semelhante a um power-up - o que é conhecido como "Sacred Fire".

Mais do que isso: se o jogador mantém o drift após esse boost (sem bater ou perder controle), a velocidade extra não desaparece imediatamente—ela se mantém enquanto o kart não frear bruscamente ou colidir.

Porque isso é importante: um problema muito sério no modo single player desses jogos de kart - especialmente MARIO KART 64 sofre muito disso - é que uma vez que você decorou o traçado, você pode correr de olhos fechados. Esse sistema de power drift, no entanto, mantem o jogador ligado o tempo todo já que o esquema não é tão fácil assim de fazer sem prestar atenção no que você está fazendo.


E só pq a Naughty Dog é a Naughty Dog, é claro que existem mecanicas mais profundas aí também como o Turbo Reserves (Um sistema que permite "estocar" boosts gerados pelo power sliding para usar depois, em vez de gastá-los imediatamente) e o Air Braking (uma técnica que permite ajustar a trajetória no ar sem perder velocidade, essencial para pistas com muitos saltos)

Essas mecanicas mais profundas não apenas dão algo para os jogadores almejarem masterizar, como são cruciais porque resolve um dos maiores problemas do modo single player em jogos de kart—especialmente em Mario Kart 64, que sofre bastante com isso. Normalmente, depois de memorizar o traçado das pistas, o desafio desaparece, e correr vira quase uma questão automática, sem necessidade de muita atenção. Os sistemas CTR mudam isso completamente. Como as mecânica exige timing e precisão para maximizar os boosts, o jogador precisa se manter concentrado o tempo todo. Não basta apenas decorar o caminho—é necessário dominar a técnica para realmente ter vantagem, tornando cada corrida envolvente independentemente de quantas vezes você já jogou.

Se você coletar dez maçãs (que são o equivalente a moedas nesse jogo), você desbloqueia uma versão mais poderosa dos seus power ups

Ou seja, pode não parecer a primeira vista, mas CTR é um jogo de altíssima profundidade mecânica. Enquanto a maioria dos kart racers se apoia em itens e sorte, CTR dá ferramentas de sobra para recompensar habilidade. Quem domina:

  • Sacred Fire → Corre mais rápido que todos.

  • Turbo Reserves → Tem boosts sob demanda.

  • Air Braking → Nunca erra um salto.

Essas mecânicas fazem de CTR um dos kart racers mais técnicos já feitos, com uma curva de aprendizado gratificante que mantém o jogo relevante até hoje, especialmente no cenário competitivo e de speedruns. Pois é, antes de rejogar o jogo para essa review eu achava que CTR era só "um Mario Kart do Crash", porém a verdade é que um jogo de corrida hardcore disfarçado de cartoon tolice.

Mas CTR não se sustenta apenas na jogabilidade refinada. Outro grande diferencial do jogo está no seu modo campanha, algo que poucos jogos do gênero realmente se preocuparam em desenvolver de forma robusta - com efeito, apenas DIDDY KONG RACING tem um modo campanha a altura e pessoalmente eu fico com CTR.


Isso pq enquanto a maioria dos kart racers oferecia apenas um modo Grand Prix básico—onde você vence a corrida em diferentes pistas —CTR trouxe uma campanha inteira, quase como se fosse um jogo de plataforma disfarçado de corrida.

O modo Adventure coloca o jogador em um mundo semiaberto, onde é possível dirigir livremente entre os diferentes circuitos, coletar troféus e enfrentar desafios específicos para avançar. Além das corridas tradicionais, o jogo introduz as provas de Relic Race e CTR Challenge, que adicionam um elemento estratégico além da simples competição. No Relic Race, o objetivo é terminar a pista dentro de um tempo determinado, quebrando caixas que congelam o relógio e incentivam o domínio absoluto do traçado. Já o CTR Challenge exige que o jogador colete as três letras "C", "T" e "R" espalhadas pela pista enquanto ainda tenta vencer a corrida, um desafio que força o jogador a explorar ao máximo cada curva e atalho.

Modo Relic: você tem um tempo a bater e cada caixa para o tempo por X segundos

E como se não bastasse, os chefes das corridas adicionam uma camada extra de desafio. Cada um tem sua própria pista e um estilo de corrida único, mas todos compartilham uma característica comum: trapaceiam descaradamente. Com arremessos infinitos de itens e trajetórias perfeitas, eles ainda usam e abusam do rubberbanding sem o menor pingo de vergonha na cara.

Sim, aqui o rubberbanding volta com força, mas a diferença é que aqui é intencional, é de uma forma que faz sentido dentro da lógica do jogo, criando momentos de pura adrenalina ao tentar superar essas barreiras injustas.


Além da jogabilidade, outro trunfo de CTR é o carisma dos personagens da Naughty Dog. Tá, todo jogo de kart mais ou menos trás personagens carismáticos, mas a questão é que Crash é diferente porque - como eu expliquei na review de CRASH BANDICOOT - o personagem foi criado como uma tentativa de trazer o estilo das animações do Tex Avery para o PS1.

Para conseguir isso, a Naughty Dog teve que macetar o hardware do PS1 que nem mesmo a Sony sabia que dava pra fazer, e o resultado final é que toda a franquia é marcada por animações expressivas, reações exageradas e muito humor do bom e velho estilo cartunesco raíz. Disso, cada personagem trás para CTR sua própria personalidade evidente nas comemorações e derrotas: Crash, com seu jeito atrapalhado; Cortex, sempre frustrado; Tiny Tiger, um brutamontes divertido, a sua irmãzinha aborrescente Coco Bandicoot; e até mesmo personagens menos conhecidos, como Ripper Roo biruleibe das ideias e Papu Papu, ganham um brilho especial no elenco. Esse elenco uber carismático eleva a experiencia do jogo, fazendo com que goste dos personagens com quem está jogando.


Então, no fim do dia, dá pra entender pq CTR conseguiu não apenas um lugar na fila do pão no meio de tantos karts de mascotes da época, como efetivamente subiu em cima da mesa e comandou a cantina inteira. Crash Team Racing não é apenas mais um kart racer dos anos 90—é a prova de que a excelência vem de inovações bem executadas. Com mecânicas refinadas que desafiam o jogador em cada curva, um modo campanha que transcende o simples "só ganhar a corrida" e personagens que exalam personalidade, CTR se ergue como um marco indiscutível no gênero. 

Mais do que competir com os gigantes como Mario Kart 64 e Diddy Kong Racing, ele redefiniu as regras do jogo, mostrando que profundidade e diversão podem coexistir em um subgenero que até então era sinonimo de pouco esforço e jogabilidade superficial.

MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
EDIÇÃO 143 (Setembro de 1999)


EDIÇÃO 146 (Dezembro de 1999)


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
EDIÇÃO 063 (Junho de 1999)


EDIÇÃO 068 (Novembro de 1999)


EDIÇÃO 069 (Dezembro de 1999)


MATÉRIA NA GAMERS
EDIÇÃO 045 (Outubro de 1999)