domingo, 25 de outubro de 2020

[AÇÃO GAMES 048] EQUINOX (ou Solstice II, no Japão) [SNES, 1993][#534]

 


Nossa história começa em 1990, quando a Software Creations (responsavel por perolas do mais baixo calibre como Spider-Man and the X-Men: Arcade's Revange e Terminator 2 ) fez um puzzle isometrico para Nintendinho chamado Solstice: The Quest for the Staff of Demons. Como este jogo é a continuação, acho prudente saber o que rola aqui.

Na véspera do solstício de inverno, Morbius, o Malevolente (com esse nome seus pais certamente esperavam grandes coisas dele) sequestra Eleanor, princesa de Arcádia, para sacrificá-la em um ritual se tornar o Barão das Trevas do Mal. De "o Malevolente" para "Barão das Trevas do Mal", eis um homem destinado ao bom caminho.



A capa europeia do jogo... não posso dizer que sinto que seu personagem está bem representado

Shadax, o mago, testemunha o seqüestro e começa a estudar sobre a fortaleza onde Morbius estava, a fortaleza de Kâstleröck para resgatar Eleanor. Sério, como a Eleanor não sofria bullying nessa terra tendo um nome tão comum é algo que apenas podemos imaginar. 

Enquanto pesquisava Kâstleröck na Biblioteca de Arcadia para encontrar uma maneira de por fim a mudança de nome de Morbius, Shadax aprendeu sobre uma entrada secreta em Kâstleröck e o paradeiro do Cajado de Demnos, uma arma antiga com o poder de derrotar Morbius. O staff estava escondido em Kâstleröck, porque era ali que Morbius menos esperaria encontrá-la. Os espiões de Morbius procuraram o Cajado, mas não o encontraram porque foi quebrado em seis pedaços e tornados invisiveis. No entanto, a cada cem anos no solstício de inverno, todas as seis peças se tornam visíveis. Sabendo como entrar, Shadax entra em Kâstleröck para reunir o Cajado de Demnos, derrubar as forças das trevas de Morbius e salvar a princesa Eleanor. 

Ao restaurar o Cajado de Demnos, Shadax procura e livra Eleanor da prisão e destrói Morbius com o Cajado de Demnos.  Uau, são muitos nomes, não são?


A capa japonesa do jogo, entretanto... é a mais poluída das três, e eu realmente acho que prefiro a capa americana. Não é todo dia que isso acontece, huh?

Vinte anos se passaram e chegamos a Solticio 2, também chamado de Equinócio, e Shadax tem uma aprendiz chamada Sonia. O que ele não sabia no entanto é que a novinha queria pegar na sua vara, mas não da forma que ele imaginava: ela queria mesmo era o Cajado de Demons. Assim, Shadax foi sequestrado para revelar a localização do cajado e cabe ao seu filho Gleendal resgata-lo. Pois é, parece que eles gastaram todas as ideias de nomes no jogo anterior...

Porém, sabe o que é interessante? Em como Gleendal sabe do destino do seu pai. Shadax escreveu uma carta do cativeiro para o seu filho e...



Caramba, essa é a carta de cativeiro mais bem elaborada que eu já vi na vida! Se o Tolkien fosse prisioneiro de guerra, certamente essa seria a carta dele!

Bem, agora que você está a par da maior quantidade de nomes mirabolantes por metro quadrado da história dos videogames, podemos finalmente falar do joguetim em si...

A primeira coisa que chama atenção é que os gráficos do Equinox são bastante impressionantes, lembrando bastante a qualidade de Shining Force ou Plok! Bem, a Software Creations fez Plok e aquele jogo impressiona pela fluidez da animação (a coisa de arremessar os membros e eles voltarem para você é muito agradavel de se ver).



Solstice: The Quest for the Staff of Demnos, lançado para o Nintendinho em 1990

Só que aqui Equinox não é um jogo de plataforma e sim um puzzle em visão isometrica, os gráficos das masmorras são muito coloridos e os personagens, objetos e inimigos (especialmente os chefes) são todos muito grandes e gostosos de se ver em um SNES. A animação do seu pequeno herói do Cavaleiro das Arábias tem uma quantidade incrível de quadros de animação para um jogo de SNES (mesmo que ao preço dele não ter pescoço)

Obviamente, a variedade é tão importante quanto a qualidade e, a esse respeito, o Equinox não decepciona. Cada masmorra do Equinox é muito única e tem um feeling temático bem próprio. A masmorra 3 nos apresenta baseadas na arquitetura inca, enquanto a dungeon 5 é um laboratório abandonado que ficou coberto de vegetação rasteira. O nível de detalhe é incrível, você consegue ver o quanto de atenção foi colocado nesse jogo desde as colunas e janelas quebradas que se estilhaçavam no chão, até as flores enormes e os tijolos cobertos de musgo, que me fazem pensar hipoteticamente: qual era o objetivo deste edifício e o que poderia ter acontecido para que ele fosse abandonado? 

Equinox é um dos raros jogos de SNES que ousa arriscar com narrativa ambiental, as dungeons são construídas de forma a você se perguntar qual a história daquele mundo e o que aconteceu ali.

Prender o cara bem embaixo da saída da dungeon para ele ver a saída e jamais alcança-la foi um toque particularmente FDP... eu adorei. Não faço ideia como esses ossos estão de pé, thou

E o mesmo se aplica a trilha sonora, elas tem uma ambientação atmosférica que é apenas perfeita para um puzzle. Alguma coisa entre o tema de Maridia de Super Metroid e as musicas de Minecraft, por si só elas fazem você comprar essa aventura no que parece ser as ruínas de uma civilização perdida!

A engenhosidade no design das masmorras não para por aí, porque o jogo usa um sistema de superficie/subterraneo que mesmo os jogos de Zelda nunca fizeram. Funciona assim: as dungeons tem vários pontos de entrada que podem ser acessados através da superficie. Então digamos que você está no sul da dungeon e quer ir para o norte da mesma.

Você pode fazer esse caminho por dentro da dungeon, mas não apenas isso é trabalhoso já que tem todo tipo de desvio, armadilha e monstro no caminho como provavelmente você não terá recolhido as chaves necessárias para abrir esse caminho. Então o que você tem que fazer é ir até a superficie e usar a entrada norte, porque o legal aqui é que existe uma correspondencia espacial entre a superficie e a dungeon.



Para ir da entrada oeste para a leste, por exemplo, nesse caso você teria que passar por 12 salas. Nesse exemplo em especial você não precisa de nenhuma chave, mas em várias dungeons são necessárias. Ou você pode ir pela superficie:



Não tem nada de interessante na superficie (exceto monstros que você pode lutar para recuperar HP e mana), mas eu realmente achei um toque muito legal usar os pontos de entrada da dungeon como parte do puzzle. Pensando bem, acho que tem algumas poucas dungeons em Ocarina of Time que fazem isso também - mas po, se você está jogando na mesma liga que Zeldinha então algo muito certo você está fazendo.

Mas... o que você faz dentro das dungeons? É aqui que as coisas ficam... tricky. É melhor explicar com um mapa da dungeon:



Seu objetivo é coletar 12 orbs para poder summonar o chefe na sala dele, para isso você precisa ir até as salas rosas. Só que não é apenas ir valsando até as salas das orbes, existe um numero bem limitado de chaves coloridas para abrir os portões - o que te fará dar muitas voltas para até conseguir as chaves necessárias para abrir caminho até onde você quer chegar.

Pegar as chaves e as orbs é onde reside o real desafio do jogo, já que é preciso resolver um puzzle em cada sala para conseguir o que ela tem a oferecer. Algumas são bastante simples como eliminar todos os inimigos da sala, já outras...





Alguns puzzles envolvem empurrar blocos, ou acertar sequencias de pulos. Agora, a assinatura estratégica do jogo é que sua visão isométrica não é gratuita: o angulo da camera é usado propositalmemnte como parte dos puzzles.

Nessa sala, por exemplo, como você chega na orb?


Super easy, barely an inconvenience! Basta apenas...


Ahá! Aposto que você não pensou nisso!

Não parece a uma primeira vista, mas a plataforma verde está alinhada com a grade... que alias até este momento do jogo não tinha nenhum indicativo que você podia subir em cima dos portões. Em algumas salas realmente impressiona os níveis escherianos em como o jogo usa a perspectiva como pegadinha para criar seus puzzles.


Mas oi?! E agora, José?

Se tivesse parado por aqui, Equinox já seria um jogo baseado em dungeons que não deve nada a Legend of Zelda. Porém a coisa vai mais além, já que cada dungeon tem uma recompensa: existe uma arma e uma magia em cada dungeon.

A arma funciona de forma bastante simples: a cada nova arma ela causa mais dano e ataca mais rápido. Já as magias são algo mais criativo: elas vão desde heal até castar slow nos inimigos da sala ou ganhar salvar em qualquer lugar como spell (normalmente você só salva quando sobe para a superficie).

Então, se Equinox faz todas essas coisas incriveis... esse é um dos maiores jogos do Super Nintendo, certo? Quer dizer, não tem como esse jogo não ter virado um clássico, certo?


ESPERA, O QUE? MAS ... COMO? TUDO PARECE TÃO INCRIVEL, MAS ...

Então...

Para começar, você se você encostar em qualquer coisa durante o jogo seu personagem perde uma vida e você tem que recomeçar a sala. Repare que eu não disse encostar em qualquer inimigo, eu disse encostar em qualquer coisa. Qualquer. Coisa.

Eu quero parar por um momento e deixar você absorver o peso dessas palavras: um toque em qualquer coisa e você perde uma vida. O que funciona tão bem quanto a descrição soa.



É, boa sorte com isso.

Apenas isso seria ruim o bastante, mas piora. Não apenas você não pode encostar em nada, mas mais frequentemente sim do que não o jogo exige saltos de precisão pixelar. Frequentemente, uma sequencia de 5, 6, 7 pulos no quais você tem que estar no pixel exato da beiradinha ou você tem que, no melhor cenário possível, começar de novo (embora grandes são as chances que você vai cair sobre alguma coisa que vai lhe custar uma vida).



Ah c'mon!

Mas calma que piora. Isso porque sendo um puzzle de visão isometrica, você pode imaginar que manobrabilidade no ar não é exatamente o forte do jogo. Não existem saltos diagonais aqui, então a única forma que você tem é pular e no meio do ar mudar a direção do pulo!



Sério, imagine o quão imprático é ter que pular e mudar de direção no ar. Agora imagine isso em um jogo onde o puzzle da sala é justamente te enganar com o posicionamento das plataformas - você não sabe com certeza para onde virar, quanto mais conseguir executar isso.
Os walkthrouhgs do jogo chamam isso de "bend jump", e de fato você sente mais que está trapaceando a programação do jogo do que usando uma feature programada. Bend Jumps são dolorosamente comuns nesse jogo, o que leva a um sem fim insano de frustração seja falhando e tendo que recomeçar os pulos ou - mais frequentemente - caindo em cima de algo e perdendo uma vida.



Imagine, apenas imagine, quantas tentativas são necessárias para fazer essa pequena manobra e você começara a contemplar o horror de Equinox

God fucking dammit! Esse jogo já é dificil o suficiente sem fazer você desejar inventar novas formas de eutanasia, e ainda sim esse jogo é um enorme exercicio de frustração e desespero! Porque eles se dão ao trabalho de fazer salas e salas que dependem inteiramente de pulos diagonais e macacos me mordam se você sair dessas salas podendo ser chamado de Avatar porque é uma quantidade de jump bending que empalideceria Oswaldo Montenegro!



COME FUCKING ON!

E adivinha o que vem agora? Apenas adivinhe! Sim, exatamente: MAS CALMA QUE PIORA!



Os chefes todos tem um visual muito legal, são grandes e assustadores na tela. Mas sabe o que mais eles são? Rápidos, ao contrário de você! E levam um bazilhão de hits para morrer, ao contrário de você que se encostar no boss uma única vez.

O cenário mais provavel é que você não vai sequer conseguir sair do caminho rápido do boss e ser atropelado pela marcha marciana da ruína marchante! (sim, inventar nomes de golpes de anime shonen é um dos meus inumeros poderes)



Isso tudo que eu disse é muito frustrante, porém ele é frustrante partindo do pressuposto que você sabe o que fazer, para onde ir e etc. O que não é o caso aqui, porque o jogo não oferece um único e maldito mapa! Meu deus, qual é o problema de vocês? Esse jogo já seria insanamente dificil tendo um mapa para se guiar, mas como vocês esperam que alguém consiga jogar ISSO:



Claro, hoje temos o gamefaqs e tal, mas em 1994 fazia como? Lia a Ação Games? Vão se foderem no patê aerado! Para adicionar ofensa a injuria, o jogo ainda é repleto de "salas secretas" e a única forma de jogar é se esfregar em todas as paredes do jogo. Quero dizer, literalmente você tem que andar roçando em todas as paredes, é assim que se joga esse jogo!



Porra, aí vocês me derrubam os butiá do bolso! Eu queria muito, muito mesmo dar um "The Best of" para esse jogo pela sua proposta, sua estrutura e o senso exploração. É uma mistura muito criativa de Metroid e Zelda com seu proprio toque de narrativa ambiental e isso é lindo!

... mas cara, não dá. Apenas não dá, esse é um dos jogos mais frustrantes que eu já joguei na minha vida e usando savestate esse jogo te levará a insanidade, sem... bem, vamos apenas dizer que eu finalmente eu entendi o que as pessoas veem em Birdbox que as fazem cometer suicidio.

Eu queria muito gostar de Equinox, mas Equinox definitivamente não quer ser gostado.


MATÉRIA NA SUPER GAME POWER
Edição 065 (Agosto de 1999)