quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

[#792][SNES/MD] WEAPONLORD [Setembro de 1995]


Estamos falando nesse momento de revistas de 1995, e isso significa uma coisa basicamente no mundo dos videogames: jogos de luta. Segundo as estatisticas do blog são o segundo genero mais prolifico aqui (atrás apenas dos jogos de plataforma, porque né) com o diferencial de que até a edição 14 da Ação Games houveram apenas três jogos de luta analisados (e todos pavorosamente ruins: ULTRAMAN: TOWARDS THE FUTURE PIT FIGHTER: The Ultimate Challenge e, Deus tenha piedade de nossas almas, HEAVY NOVA). Ou seja, os jogos de luta sairam 14 edições atrás dos outros generos e ainda sim tem um segundo lugar tranquilo.


MAS O QUE MUDOU A PARTIR DA EDIÇÃO 014 DA AÇÃO GAMES?

A nação do fogo atacou STREET FIGHTER II: THE WORLD WARRIOR. É assim que começa. A febre. A raiva. A sensação de impotência ao ver suas fichas perdidas que torna homens bons em cruéis ratos de fliperama. E, mais importante, começou uma corrida do ouro de todas as desenvolvedoras para ser o próximo STREET FIGHTER 2 ou, em última instancia, MORTAL KOMBAT. E como eles pretendem ser a "próxima grande coisa"? Fazendo basicamente a mesma coisa que esses dois faziam, em maior ou menor grau de chupinhação na cara.

Só que volta e meia, bem raramente, quando os planetas se alinhavam e as estrelas estavam certas, alguém tentava fazer algo diferente em jogos de luta. E esse é um desses casos, em que WeaponLord pode ser acusado de muitas coisas, mas não de não tentar fazer algo novo. Mas vamos começar do começo.

Esse jogo contem backgrounds nervousors, isso precisa ser dito

Os designers principais do jogo, James Goddard e Dave Winstead, eram ex-funcionários da Capcom que tinham trabalhado anteriormente em vários jogos da série Street Fighter. Goddard foi co-designer e produtor americano de STREET FIGHTER 2 CHAMPION EDITION e STREET FIGHTER 2 TURBO: Hyper Fighting e projetou o personagem Dee Jay para SUPER STREET FIGHTER 2: The New Challengers e Winstead trabalhou em SUPER STREET FIGHTER 2: The New Challengers também. 

Ou seja, dá pra ver que eram caras que entendiam bastante de Street Fighter e que sairam da Capcom para a Namco justamente porque queriam fazer alguma coisa que não fosse Street Fighter, queriam fazer algo diferente, algo próprio que nunca tinha sido tentado antes. Mas... o que poderia ser isso?


A resposta veio a eles no final de 94 quando, assim como todo mundo, eles ficaram bastante impressionados com VIRTUA FIGHTER - embora não pelos mesmos motivos. Veja, em 1994 foi a primeira vez de muita gente que eles tinham visto um jogo 3D rodando bem, rodando fluído e mamulucolisticamente e isso de fato era deveras impressionante. Porém o que impressionou Goddard e Winstead foi mais outra coisa: o conceito do jogo.

A ideia de VIRTUA FIGHTER, como eu expliquei naquele review, era fazer um jogo de luta que fosse uma arte marcial de verdade e que você tivesse que aprender o movimento do corpo dos personagens para dominar seus movimentos em peso, alcance, tempo de reação. Usando a engine 3D do jogo a máquina calculava isso de forma consistente e criava uma pessoa virtual que o jogador deveria aprender seus movimentos e limitações da mesma forma um artista marcial aprende a controlar o próprio corpo.


O que, como dá pra imaginar, não foi uma abordagem muito popular porque a maior parte das pessoas não tem paciencia e disciplina para dominar uma arte marcial na vida real, quanto mais em um jogo que eles só querem apertar botões e que coisas aconteçam. Mas a dupla ficou encantada pelo conceito e pensou: "hmm, e se a gente fizesse uma parada assim só que focando em armas ao invés de focar em artes marciais?".

E ESSE é o conceito de WeaponLord.

E destroçar a cabeça depois de decaptada, isso é parte do conceito também.

Cada personagem tem o seu próprio peso, timing e força, e mais importante, uma arma única que funciona com suas próprias regras. Então a ideia é que o jogador não apenas pegue um personagem e saia apertando botões aloucadamente e sim que ele aprenda a controlar esse personagem como se fosse uma extensão do seu próprio corpo, conhecendo os movimentos e tempo de reação de cada arma como um lutador marcial. 

Então a pergunta que tem que ser feita é: isso funciona?


Hmm, eu diria que ao que se propõe a fazer WeaponLord entrega o conceito: você realmente tem que aprender cada personagem, não é o tipo de jogo que você pega e sai apertando botões. Em uma era em que todo e cada jogo de luta tentava ser Street Fighter ou Mortal Kombat, a ideia de fazer um Virtua Fighter 2D baseado em armas é algo realmente diferente. 

Kudos ainda para os desenvolvedores porque ao contrário de Virtua Fighter, onde o jogo faz todos os calculos de peso e movimentação uma vez que você criou o modelo de personagem 3D, aqui foi tudo calculado e ajustado na unha mesmo, pixel por pixel, projetado frame por frame. A fisica das armas ficou muito boa e quando um personagem defende com a espada, o outro tem aquele knockback abrindo a defesa dele como se você realmente tivesse dado um porradão direto no metal - o que é muito cool.

Então, sim, o jogo faz um trabalho notavel em ser diferente. Parabens. Mas "ser diferente" é o suficiente para ser um jogo bom? Então, é ... complicado.

Como o jogo se concentra em espadas, clavas e lâminas, ele não é como os outros jogos de luta com chute e soco ataque fraco, médio e forte. Em vez disso, você espadada (ou seja lá o que for a sua arma) frente e para trás. Então tem ataque para frente e ataque para trás rápido mas fraco, médio e lento, mas forte. 

Porque sério, um jogo de luta funciona assim: faz um comando no direcional e então aperta um botão. Simples, eficiente, todo mundo já internalizou isso a esse ponto. O que WeaponLord faz é: segura um botão do controle, aí faz o comando e então solta o botão. Sabe, quando você está fazendo uma coisa que NINGUÉM MAIS FAZ, sempre é salutar parar e se perguntar se não existe um motivo pelo qual NINGUÉM MAIS faz as coisas dessa maneira - você vai se surpreender em quantas vezes existe um motivo para NINGUÉM MAIS usar essa ideia genial que vc teve.

No caso, fazer os golpes especiais de WeaponLord é incrivelmente contraintuitivo e clunky, e mais frequentemente você vai se pegar usando apenas os golpes normais (espadada, chute normal e etc) ou então os poucos movimentos que são golpes de lutas normais (direcional+botão).  Okay, eu também considero que pode ser só problema meu que eu não quis tirar tempo para dominar esse sistema... mas considerando que NINGUÉM MAIS usou esse sistema nunca mais... eu diria que não devo ser só eu o problema não.


Outra coisa que não é exatamente um problema que estraga o jogo, mas diminui muito o seu potencial de diversão e esse é o fato que os fatalities desse jogo são abusivamente legais.


E COMO ISSO É UM PROBLEMA, EXATAMENTE?

Não é. Os Fatalities nesse jogo são incrivelmente violentos, mas não MORTAL KOMBAT 3 violencia que é ridicula de tão forçada, eu quero dizer violento tipo violento mesmo. Tipo violento nível "barbaro viking abrindo as entranhas do inimigo com um pedaço de metal", o que é muito cool. O que é menos cool é o sistema de fatalities que, novamente, tenta ser diferente apenas pelo prazer de ser diferentes.

O que eles fizeram aqui foi tentar misturar KILLER INSTINCT com MORTAL KOMBAT. Isso significa que existem duas maneiras de executar os inimigos: fazendo o comando durante o combo que mata o inimigo (como os ultracombos de KI), ou então o tradicional fatalitie após a luta. O primeiro é bastante dificil de executar embora recompensador quando você o faça, mas o segundo é apenas ridiculo.

Isso porque você não tem uma tela de "Finish Him" nem nada, você tem apenas um segundo entre o adversário estar caído no chão e a contagem de pontos após a luta terminar para fazer o comando e eu estou sendo literal aqui, é UM SEGUNDO MESMO. Sério, na maior parte das vezes você ainda está na adrenalina de ter vencido a luta e nem se dá conta que tá na hora de executar o comando. Diferente pelo prazer de ser diferente, de novo.


No aspecto visual, bem, essa arte "Conan HQ-Europeia suja´" não é muito a minha coisa realmente, mas eu respeito a consistencia e qualidade para quem gosta. Alias esse foi o motivo que esse jogo não me chamou muito atenção na época, eu sempre fui mais o tipo Otaku Safado do que HQ Underground Europeia, então meh. Mas é bom pra quem gosta, nada a reclamar sobre isso.

Quanto aos aspectos tecnicos, esse jogo tem uma curiosidade interessante: o numero de quadros de animação nesse jogo é consideravelmente baixo. Isso dá um visual meio duro e lento ao jogo, mas não foi feito por desleixo dos produtores e sim intencionalmente: o jogo foi projetado para ser o carro-chefe do X-Band, um sistema para jogar SNES via rede telefonica.


O X-Band foi um serviço rudimentar de LAN para consoles: o acessório telefona para uma central telefonica própria que te conecta a outro jogador usando o X-Band. Por essa razão o numero de frames de animação era baixo, para ter menos informação passando pelo sistema e por consequencia diminuir o lag. Muitos jogos clamam ser "a frente do seu tempo", mas WeaponLord foi projetado desde o inicio para ser jogado online em um console doméstico de 1995! Não tem como ser muito mais a frente do seu tempo do que isso.


WeaponLord não se tornou um grande sucesso comercial de imediato devido a sua complexidade de controles (os criadores atribuem a culpa a ser lançado no final da vida do SNES, mas isso não procede já que outros jogos vieram DEPOIS dele e tão tidos como classicos atemporais como Super Mario RPG, Yoshi's Island e Chrono Trigger), dificuldade injogavel no modo single player (não apenas o jogo é brutalmente dificil, como você não tem continues, perdeu uma luta acabou) e comandos esquisitos, mas não quer dizer que tenha sido tudo em vão já que o jogo deixou um legado no final das contas. A Namco gostou da ideia de fazer um jogo de luta baseado em armas mais do que em golpes de artes marciais e esse conceito foi transportado para sua série Soul Calibur, que tá aí firme e forte até hoje.

Então, o WeaponLord definitivamente parece extraordinariamente desajeitado no início, o que não é ajudado pelos oponentes imensamente inbatíveis. É bastante fácil simplesmente chamá-lo de um jogo de luta "ruim", mas quando você entende o conceito e o que ele tenta fazer... é um jogo que faz bem o que tenta fazer, só que o que ele tenta fazer não é para todo mundo - definitivamente não para mim. Sim, é muito complexo. Sim, ele é meio lento. Mas novamente, dentro do que ele quer fazer funciona - se você gastar algumas horas com um FAQ para aprender os controles e se acostumar aos comandos diferentes pelo prazer de ser diferentes. 

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