terça-feira, 19 de agosto de 2025

[#1533][Fev/2000] THE RING: Terror's Realm


Uma das coisas que eu acho mais fascinante na literatura é que ela frequentemente reflete mais do que apenas histórias — gêneros e tendecias atuam como espelhos para as preocupações, ansiedades e obsessões de uma época. Um exemplo muito claro aconteceu na década de 80: nos Estados Unidos, a economia estava em declínio, a violência urbana estava em ascensão, o futuro parecia incerto e a vida humana parecia cada vez mais barata. Filmes como ROBOCOP ou Taxi Driver mostram bem a visão desesperançada e suja desse período.

Ao mesmo tempo, a tecnologia japonesa a cada dia parecia mais e mais que ia dominar o mundo — de videogames e videocassetes a walkmans e televisores. Essas forças culturais e tecnológicas deram origem ao gênero cyberpunk, uma visão sombria e distópica na qual o capitalismo japonês e a tecnologia fria dominam o mundo, esmagando a humanidade sob seu peso massivo e impessoal. A literatura e o cinema tornaram-se um palco para explorar e dar vazão a esses medos coletivos.

Mas por que eu estou falando isso? Porque, nessa mesma época, o Japão enfrentava seu proprio conjunto de ansiedades e preocupações sociais — só que no caso deles o medo era biológico. Os avanços na biotecnologia, como a fertilização in vitro e a clonagem, combinados com o surgimento de novas doenças como a AIDS, despertaram o medo do bioterrorismo e do potencial descontrolado da ciência. Essas preocupações encontraram um poderoso canal na literatura e no cinema japonês da época. O terror e a ficção científica tornaram-se meios para explorar o corpo como um local de vulnerabilidade, para imaginar vírus, mutações e forças incontroláveis que poderiam mudar para sempre a vida cotidiana, e não para melhor.

Em outras palavras, assim como o cyberpunk processava o impacto social da tecnologia e da globalização, o bioterror japonês do início da década de 1990 permitiu que leitores e público lidassem com as consequências reais e imaginárias do progresso científico, dando forma a uma ansiedade coletiva que era ao mesmo tempo visceral e intelectualmente irresistível. 


Obras como PARASITE EVE, de Hideaki Sena (que ganhou popularidade adicional no Ocidente graças a continuação na forma de jogo para PS1) não eram apenas histórias de terror — eram a cristalizaram das ansiedades de uma sociedade à beira de uma revolução biológica e tecnológica. E hoje, quero falar sobre outro exemplo dessa literatura de bio-horror que se tornou imensamente popular no Ocidente: O Chamado, de Koji Suzuki.

[WOW, WOW, ESPERA, TEMPO, TEMPO!]

O que foi desta vez, Jorge?

[OK, EU ENTENDI A METÁFORA — O CHAMADO É UMA HISTÓRIA DE TERROR EM QUE VOCÊ PRECISA COPIAR A FITA E "INFECTAR" OUTRA PESSOA PARA SOBREVIVER. MAS EU NÃO CHEGARIA AO PONTO DE CHAMAR O CHAMADO DE UMA HISTÓRIA DE BIO-TERROR. É UMA HISTÓRIA DE FANTASMAS TÃO FANTASMAGÓRICA QUANTO FANTASMAS PODEM SER!]

Hmm, tá, entendi qual é o problema. Se você só conhece O Chamado, também pode pensar isso — seja o livro original, o filme japonês de 1998, Ringu, ou a adaptação americana de 2002. Mas aqui está a questão: "The Ring" é apenas o primeiro volume da trilogia de Koji Suzuki (The Ring → The Spiral → The Loop), e as sequências não são nada remotamente perto do que vc poderia imaginar que elas sejam.

Primeiro, vamos tirar o elefante do poço no meio da sala: eu não preciso explicar O Chamado para você. É um dos filmes de terror mais populares de todos os tempos. Um quarto de século depois, a imagem icônica de Samara rastejando para fora da TV está gravada no imaginário popular como se tivesse acontecido ontem. O filme japonês de 1998 difere um pouco no tom. Samara faz o icônico rastejar da TV apenas uma vez, e o filme foca mais no sobrenatural desconhecido do que em regras rígidas — pense mais misticismo do kaidan xintoísta e menos em um Death Note com regras sólidas como as coisas funciona.

Mas a ideia básica é a mesma: (spoilers) uma garotinha foi jogada em um poço, deixada para morrer de fome e tentou arranhar seu caminho de volta para a superficie em desespero por sete dias antes de finalmente morrer — e na morte, ela se tornou um espírito incrivelmente raivoso. Agora, qualquer um que assista à sua fita amaldiçoada está condenado a morrer em sete dias.

Esse gif da Samara jogando baseball não tem nada a ver com nada, mas eu não poderia perder a chance de usa-lo

No filme japonês, a fita em si é, na verdade, menos importante do que o lugar onde é assistida: a fita funciona mais como um recipiente do que como um objeto amaldiçoado — Sadako (a Samara japonesa original) poderia, teoricamente, transmitir sua maldição através de qualquer outra coisa. Mas a lógica geral permanece: você vê a mensagem dela, você morre em sete dias a menos que a copie e a passe adiante. É o maior esquema de pirâmide de todos os tempos. Mas, como eu disse, essa parte todo mundo e a mãe já sabe. O que você não sabe é para onde a história vai no próximo livro, "A Espiral" — e é aí que as coisas ficam realmente, realmente loucas.

Se O Chamado era uma história de fantasmas com uma garotinha absurdamente putassa matando geral e uma fita amaldiçoada, "A Espiral" chuta o balde completamente. A história passa de uma lenda urbana assustadora para um horror médico e científico completo. O protagonista não é mais um jornalista investigando um fantasma; em vez disso, acompanhamos um patologista, Dr. Mitsuo Andō, que realiza uma autópsia em Ryuji Takayama (o único cara que realmente morre com Sadako rastejando para fora da TV no primeiro livro). O que ele descobre é assustador: as mortes causadas pela maldição de Sadako não são apenas acidentes sobrenaturais — são o resultado de algo que se comporta como um vírus.


E aqui está a coisa: esta não é a COVID-1999. O chamado Ring Vírus pode alterar o DNA, manipular células e até ressuscitar os mortos — tudo a serviço de se espalhar ainda mais. Sadako, longe de ser um fantasma aprisionado, agora se revela como uma força quase imparável que usa esse poder viral para garantir sua sobrevivência. A fita amaldiçoada é apenas o primeiro "vetor". O verdadeiro horror está na forma como esse vírus pode se propagar, infectando a humanidade de maneiras que parecem terrivelmente plausíveis. Em suma, "A Espiral" pega a história de fantasmas que você achava que conhecia e a injeta com biologia, ciência e uma sensação incômoda de inevitabilidade, transformando a narrativa em uma fusão de suspense médico e terror que faz o primeiro livro parecer comportado em comparação. 

Então, se alguém te dissesse que na sequência Samara se torna a Umbrella Corporation e vira a prima do Nêmesis de RESIDENT EVIL 3: Nemesis (sem o sobretudo estiloso, infelizmente), você provavelmente descartaria como uma fanfic ruim. A questão é que basicamente é isso que "A Espiral" apresenta (o título, no caso, se refere a hélice espiral do nosso DNA que é mutado pelo Ring Vírus). Ela reformula completamente tudo o que você achava que sabia sobre o primeiro livro. Nossa percepção de Sadako como um espírito vingativo foi a forma que interpretamos a história pq projetamos nosso folclore e preceitos para fazer os fatos se encaixarem a eles.

Agora, a forma que isso os eventos do primeiro livro são mostrados sobre uma nova luz é a parte mais interessante da continuação: as pessoas não são infectadas simplesmente porque assistiram à fita na cabana que fica em um lugar amaldiçoado— pelo menos, não da maneira que pensávamos. É menos uma coisa sobrenatural, e mais que o lugar é o ground zero do vírus. Mas pq parecia tanto que era um fantasma boladão matando geral? Pq o vírus é inteligente e faz o que for necessário para se propagar — incluindo poupar um hospedeiro colaborativo que ajude a sua disseminação. E o vírus pode até ressuscitar ou fazer mutações em cadáveres para que eles pareçam com o que precisar que eles pareçam para fazer os hospedeiros mais colaborativos na sua disseminação (como de facto ele usa o cadaver da Sadako para criar a lenda urbana do episódio anterior).

Esse cara não tá legal, alguém dá uma água pra ele

Isso quer dizer que a "A Espiral" explora mais o psicológico dos personagens, com o vírus assumindo a forma de entes queridos ou o que for necessário para manipular as pessoas, o que torna a história mais psicologicamente carregada do que o primeiro livro, que se concentrava mais na investigação. O vírus sabe como manipular os sentimentos humanos contra nós — ele até conta com a nossa simpatia pela trágica história de Sadako para enganar os investigadores sobre o que ele realmente é. Ao se camuflar no folclore e se misturar com lendas urbans, ele garante que sigamos pistas erradas e percamos tempo sem entender com o que realmente estamos lidando até que seja tarde demais.

Em outras palavras, "A Espiral" não é apenas uma continuação de uma história de fantasmas — é uma aula magistral sobre como transformar percepção, emoção e biologia em horror, manipulando as expectativas não apenas do que os personagens já estavam predispostos a acreditar, mas brinca com as as próprias expectativas do leitor sobre de para onde essa sequencia caminharia.

[HÃ, CERTO... ENTÃO TEMOS ESTE VÍRUS SUPERINTELIGENTE QUE BRINCA COM AS EMOÇÕES DAS PESSOAS E ATRAPALHOU A INVESTIGAÇÃO SE DISFARÇANDO DE FOLCLORE... CERTO... MAS ISSO NÃO É UM POUCO FORÇADO? QUER DIZER, EU SEI QUE PARASITE EVE É SOBRE MITOCÔNDRIAS COM UM PLANO MEGALOMANÍACO PARA EXTERMINAR A HUMANIDADE E COISAS DO TIPO, E ISSO É ALGO QUE ACONTECE EM LIVROS DE BIO-HORROR JAPONESES... MAS, QUAL É, COMO UM VÍRUS PODE SER TÃO INTELIGENTE? NÃO PARECE PLAUSÍVEL.]

Definitivamente não parece. E os próprios personagens do livro se fazem essa mesma pergunta que será respondida apenas no terceiro volume da trilogia — de longe o mais louco de todos: "The Loop".


Porque se você achou que do primeiro para o segundo livro o genero dá uma virada de mesa e leva a narrativa para uma direção completamente inesperada, Loop não vira a mesa: ele a pulveriza. A história revela que o "mundo real" que temos acompanhado não é inteiramente real — é uma simulação de computador chamada Loop, projetada para estudar a evolução. A maldição de Sadako, o Vírus do Anel e todos os eventos dos livros anteriores foram parte de um experimento controlado dentro desse ecossistema digital. O vírus não é apenas inteligente; é um produto da evolução artificial, capaz de aprender, se adaptar e encontra uma forma de escapar da simulação para a própria realidade.

É aqui que a trilogia se aprofunda inteiramente na ficção científica. A maldição não é mais apenas um fantasma ou um agente viral: é uma inteligencia artificial autopropagante, determinada a dominar o mundo real.

Em outras palavras, Loop pega tudo o que você achava que sabia sobre a maldição, o vírus e Sadako e joga tudo em um liquidificador de ficção científica sem tampa. O que começou como uma simples história de fantasmas sobre uma fita de vídeo amaldiçoada se transformou em uma exploração da inteligência, da evolução e das formas aterrorizantes como a vida — digital ou biológica — pode se propagar quando não está sob controle.

[VOCÊ ESTÁ ME DIZENDO QUE "THE RING" ERA NA VERDADE UMA ESPÉCIE DE MATRIX O TEMPO TODO? VOCÊ ESTÁ INVENTANDO ISSO.]

Juro por Arceus que não. As coisas são malucas assim, e na minha opinião, no bom sentido. Pense na trilogia do Chamado como uma prima distante de Ataque dos Titãs — uma história que começa como uma história de terror, mas quando o escopo se amplia você percebe que era uma história de guerra o tempo todo. The Ring funciona da mesma forma: o que começa como uma história de fantasma tão fantasmagórica que poderia assombrar seus sonhos, na verdade evolui para uma história de ficção científica sobre inteligência artificial e um vírus criado por bioengenharia.

Pessoalmente, acho essa reviravolta brilhante. Mas tá, eu admito que eu sou um esquisitão que pira com ideias criativas como essa — a maioria das pessoas não gosta de receber o que não esperava. Como resultado, a adaptação cinematográfica japonesa de The Spiral foi um fracasso retumbante. O público queria mais garotas mortas vingativas, não um thriller de terror viral transformado em ficção científica. O fracasso foi tão grande que The Loop nunca sequer ganhou uma adaptação adaptou. A Toho rapidamente varreu The Spiral para debaixo do tapete e, em vez disso, produziu "The Ring 2" em 1999, que não tinha nenhuma conexão com os livros de Suzuki e é uma sequencia de fantasmas do primeiro filme, seguido por sua própria prequela em 2000: "The Ring 0: Birthday" .

E quando o remake ocidental de 2002 se tornou um fenômeno mundial, o reconhecimento da existencia das sequências dos livros tornou-se quase um tabu — sussurrado como uma teoria da conspiração pelos poucos que sabiam. Fãs de fora do Japão (o que incluia eu mesmo até alguns dias atrás) em grande parte não fazem a mais remota ideia que a história que tanto amavam como um conto de fantasmas tinha esse icebrg viral e de ficção científica à espreita logo abaixo da superfície.

A única prova de que a história originalmente segue nessa direção completamente inesperada (além dos próprios livros, obviamente) existe na forma desse survival horror para o Dreamcast do início dos anos 2000... e eu tenho que dizer, quando eu entendi sobre o que esse jogo realmente era eu realmente acreditei que o Dreamcast finalmente tinha perdido a pouca sanidade que restava.

Nossa história nesse jogo é sobre Meg, cujo noivo trabalhava no CDC e morreu misteriosamente. Ela decide então continuar sua pesquisa, afinal como a própria tão bem coloca, "I shouldn't mourn your death forever! It's ALREADY been 12 hours since you died. I need to move on with my life". Uma guerreirinha que venceu o luto, eu te digo

Quer dizer, o último console da Sega já era um paraíso para survival horrors completamente birutas da cabeça tão ruins que são bons, como D2 ou SEVEN MANSIONS: Ghastly Smile. Mas mesmo para os padrões do Dreamcast, "The Ring: Terror's Realm" pareceu ter ido longe demais: um jogo The Ring que na verdade é sobre realidade virtual, uma simulação estilo Matrix onde as pessoas ficam presas e o "The Ring" é um MMO/Vírus de Computador? Meu cérebro deu cambalhotas.

Aqui está a coisa: como você viu até aqui, "The Ring: Terror Realm" não é o sonho febril mais estranho de um console famoso por jogos biruleibes... mas, neste caso, está realmente tendo um ponto aqui. Surpreendentemente, a Asmik Entertainment não tem culpa desta vez (ao contrário de seu catálogo de horrores, como LESTER THE UNLIKELY ou VIRTUAL HYDLIDE). Em vez disso, Terror Realm é a única adaptação fiel da trilogia de Suzuki que veremos. Ela abraça o núcleo de ficção científica, viral e realidade virtual da história — e isso é algo que nunca mais vamos ver em nenhum outro lugar.

Mas se a Asmik está desculpada por este cenário bizarro — onde The Ring é tanto um surto viral quanto um vírus de computador — o que eles realmente entregaram... bem, isso é bem mais dificil de desculpar. E nem demora muito pra você começar a ver das red flags. Ao abrir o menu de opções e você ouve os efeitos sonoros de — eu juro — um tomate esmagado e alguém pisando com sapato molhado. Não, eu não estou inventando:

Toda vez que você confirma uma opção do menu, ouve sploooosh como um desenho animado. E esse é o mesmo efeito sonoro de levar um tiro. Não consigo nem imaginar a lógica por trás da escolha de um efeito sonoro que parece o resultado do Urso Fozzie contando uma piada ruim para um jogo de survival horror.

E não para por aí. O jogo está cheio dessas escolhas... pitorescas. Sua personagem principal, por exemplo, tem um sorriso perturbador constante como se estivesse fazendo um teste para o papel do Coringa na série de TV de 1966. Não tem absolutamente nenhuma razão na história para ela sorrir como uma lunática o tempo todo. Na verdade, sua personagem é bem preocupada e tensa, mas seu modelo está perpetuamente preso a esse sorriso perturbado, transformando momentos que deveriam ser aterrorizantes em algo involuntariamente hilário.

Ao menos a mira automática funciona bem e a iluminação é maneira, o que impede que esse jogo seja injogável

E para ser sincero, o jogo todo tem esse ar apressado e é cheio de recursos inacabados. Tem vários modelos não utilizados no disco, e o jogo em si tem apenas uma única dungeon pela qual você corre indefinidamente, sem quase ninguém lhe dizendo muito o que você realmente deve fazer.

A jogabilidade também sofre muito dessa falta de conteúdo: vc fica preso no mesmo cenário enfrentando os mesmos três tipos de inimigos durante todo o jogo: macacos-humanos, macacos-demônios e macacos-gordinhos. Até as lutas contra chefes são pouco inspiradas — o chefe final é basicamente um macaco-demônio mais rápido e forte. A única exceção é a própria Sadako, mas quando você finalmente a derrota, o final é tão breve que mais ofende que gratifica.

Meg (sua protagonista-joker) e os outros personagens são bem insossos e desinteressantes, quase não fazendo nada de notável. Tirando um único PC, nenhum outro tem um arco de personagem ou fazem qualquer coisa interessante. Na verdade, vários NPCs simplesmente desaparecem da história sem nenhuma explicação — elas nunca são mostradas indo embora com segurança, e a Meg não parece se importar nem um pouco. Se está inacabado ou apenas a Asmik estava  poucou ou nada se lixando eu não sei dizer, apenas que a coisa deixa uma grande sensação de vazio.

"Uhuhu, eu vô comê a tia do Bátima!"

Mecanicamente, enquanto o jogo não é um survival horror de sofrimento e dor como EVIL DEAD: Hail to the Kingo gameplay em si tem severas limitações. A mecanica que os inimigos só te atacam quando vc tá com a lanterna acesa é interessante pq te faz escolher entre enxergar mas ao risco de atrair ataques, mas os inimigos em si são meio bosta - especialmente pq os inimigos atordoam quando levam um tiro, então dar stunlock neles é bem fácil na real. E eu não posso dizer que sou particularmente fã da batalha final contra a Sadako pq o jogo limpa seu inventário, te tirando todas as armas, itens de cura e munições antes do chefe final.

Sinceramente, parece que este jogo foi feito de forma barata, principalmente para lucrar com a licença de The Ring para aproveitar o lançamento de "The Ring 0: Birthday", que foi mais ou menos na mesma época, embora pq eles não fizeram um jogo baseado nos filmes em si é algo que eu não faço ideia do motivo, talvez daria mais trabalho. O que eu sei é que os desenvolvedores nem se deram ao trabalho de aproveitar ao máximo o que tinham — um prédio, três modelos de inimigos reciclados espalhados e pouquíssima variedade de jogabilidade. 

E então essa é a bizarra história de uma franquia que é um dos pilares da cultura pop... e que bem pouca gente realmente conhece passado o primeiro episódio. Quase todo mundo reconhece a imagem de Samara rastejando para fora da TV, a fita amaldiçoada, a contagem regressiva de sete dias — é icônico. Mas vc pode contar nos dedos quantas pessoas fora do Japão (ou mesmo dentro) que tem noção de para onde a história realmente se encaminha depois daquela primeira história de fantasma. O horror viral, bioengenheirado e com simulação de The Spiral e Loop? Praticamente inédito. A reviravolta inteligente de que a "maldição" é parte de um sistema inteligente que manipula tanto as emoções quanto a biologia humanas? Quase ninguém sabe.


E o pior é que as poucas tentativas de adaptar esse universo multifacetado e alucinante para outras mídias foram... decepcionantes, na melhor das hipóteses. As sequências da Toho ignoraram completamente os livros, os remakes ocidentais seguem o mesmo caminho só que com orçamento maior - o que é bem utilizado que fazem bom uso do orçamento maior embora várias coisas relevantes tenham se perdido na adaptação cultural. A única versão multimídia semi-fiel acaba sendo esse jogo bizarro e mal-acabado para Dreamcast, The Ring: Terror Realm. É confuso, inconsistente e, sim, absurdo ao extremo. Mas, à sua maneira estranha, é o mais perto que alguém fora dos livros já chegou de ver a visão completa e distorcida da trilogia.

E aqui está a ironia suprema: O Chamado é sobre Samara exigindo que sua história seja contada — mas a própria trilogia tem sido tratada como um segredo enterrado nas profundezas do poço cultural, mal contado, mal compreendido e quase perdido no tempo. É como se a história da garota que só queria ser lembrada espelhasse o destino de sua própria saga: amplamente comentada, superficialmente conhecida, mas amplamente ignorada em toda a sua complexidade aterrorizante.

E vamos encerrar com esse momento que me fez perder tudo, a Sadako metendo um "my people need me, VUUUP!"




MATÉRIA NA AÇÃO GAMES
EDIÇÃO 144 (Outubro de 1999)



MATÉRIA NA GAMERS
EDIÇÃO 060 (Abril de 2000 - Semana 2)